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CAPÍTULO 21 | ||
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| CENA 01 | Manhã. Clínica de aborto clandestina. Int. Continuação do capítulo anterior. Fabiana e Luciano se surpreendem com a chegada dos amigos ao local. A enfermeira está desconfiada, enquanto as outras mulheres no local estão assustadas. Os ânimos começam a se exaltar. LUCIANO: O que é que vocês estão fazendo aqui? BRUNA: Pelo amor de Deus, Fabiana. Desiste dessa loucura. É seu filho! Fabiana entra em desespero, corre para os braços da amiga e começa a chorar, convencida. A enfermeira está impaciente. MARCELO: Que ideia foi essa, Luciano? LUCIANO: Não se metam nisso. Esse problema é só meu e da Fabiana. MARCELO: Você tá maluco? Quer tirar a vida do seu próprio filho? LUCIANO: Eu não quero e nem posso ser pai. EU NÃO VOU SER PAI. A Fabiana vai tirar essa criança sim e ninguém vai impedir. BRUNA: Como você pode ser tão frio? LUCIANO: Vocês não têm o direito de se meter. Vamos, Fabiana! Luciano tenta puxar Fabiana dos braços de Bruna. MARCELO: Eu não vou deixar você fazer essa loucura. Marcelo se mete entre as meninas, empurrando Luciano, deixando-o irritado. LUCIANO: Você não é ninguém pra dizer o que eu devo fazer ou não. Luciano dá um soco em Marcelo, que vira o rosto com a intensidade da pancada. ENFERMEIRA: Não temos o dia todo. Outras pacientes estão esperando. Marcelo se recupera do soco pondo a mão no lábio, que está sangrando. MARCELO: Nós somos teus amigos, cara. E estamos tentando impedir que vocês cometam um crime do qual se arrependerão pelo resto de suas vidas. Põe a mão na consciência. Essa criança não tem culpa de nada. E você não pode ser tão irresponsável a ponto de colocar a vida da Fabi em perigo. Luciano passa as mãos pela cabeça, preocupado. BRUNA: Vamos embora daqui. ENFERMEIRA: Vocês não podem sair assim... Sirenes da polícia são ouvidas ao fundo, para desespero de todos no local. A enfermeira entra em pânico e saca uma arma de sua roupa para espanto geral. ENFERMEIRA: Vocês nos denunciaram? Seus cretinos! Correria e gritaria entre as pacientes do local. A enfermeira aponta a arma para os republicanos que ficam acuados. Dois policiais invadem o local, o que faz com que a enfermeira tente fugir surpreendendo pela atitude e soltando a arma que segurava em qualquer lugar. Um dos policiais a imobiliza antes que ela consiga escapar algemando-a logo em seguida. O outro policial examina a arma da mulher e dá uma risada frouxa. POLICIAL 1: Isso aqui não mata nem barata. É de brinquedo. POLICIAL 2: A senhora está presa, dona Mercedes. A mulher olha com ódio para os republicanos. MERCEDES: Maldita hora que vocês pisaram aqui dentro. MARCELO: Seus dias de ceifadora de vidas inocentes acabaram. BRUNA: Graças a Deus. POLICIAL 1: Os quatro. Nem pensem em sair daqui. Marcelo olha Luciano com ar de reprovação. Fabiana continua chorando nos braços de Bruna que está visivelmente amedrontada. Os policiais levam a mulher algemada. | CENA 02 | Universidade Campelo Costa. Interior. Banheiro feminino. Vanessa entra no local se desmanchando em lágrimas. A moça vai até o espelho e passa a mão pelo cabelo loiro, deixando as lágrimas caírem sem enxugá-las. Ela volta a sentir repúdio e a lembrar-se da violência que sofreu. FLASHBACK O semblante amigável de Ronaldo se converte em um misto de malícia e maldade. RONALDO: Porque agora somos só nós dois, belezinha. Eu e você. Vanessa se desespera. Ronaldo se aproxima dela. VANESSA: Me deixa ir embora. Eu não quero ficar aqui. RONALDO: Calminha, gostosa. A gente nem começou a se divertir ainda. Ele começa a agarrar Vanessa a força tirando-lhe a roupa com grosseria. Vanessa chora desesperada, enquanto Ronaldo parece sentir prazer com a situação. Ele a joga na cama e tira a calça jeans que Vanessa usava. Ela grita. FIM DO FLASHBACK Vanessa está sentada no chão do banheiro, desolada. Sentindo-se culpada. Ao perceber que está sozinha ali, ela se levanta imediatamente aparentando estar com medo. | CENA 03 | República Universitária Laços de Amizade. Interior. Sala. Celina e Janaína conversam sentadas no sofá. Marcelo, Bruna, Fabiana e Luciano chegam a casa causando surpresa em Celina. Luciano e Fabiana ignoram a todos e sobem para os quartos. CELINA: ¿Qué están haciendo aqui tan temprano? [O que estão fazendo aqui tão cedo?] BRUNA: (surpresa) Mãe? Quê que VOCÊ tá fazendo aqui? JANAÍNA: Eu vim... Bruna a corta. BRUNA: Você me explica depois. Agora eu não posso. Bruna sobe as escadas, seguida de Marcelo. JANAÍNA: Eles não tinham que estar na faculdade? CELINA: Sí, por supuesto. CORTA PARA Interior. Quarto Maçã. Fabiana entra com os olhos marejados. Não demora muito para Bruna aparecer. BRUNA: Como é que você tá, amiga? FABIANA: Graças a Deus que vocês apareceram lá há tempo. Eu ainda não acredito que tive coragem de quase matar meu filho. Que tipo de mãe eu vou ser, Bruna? Eu não tenho o direito de tirar a vida de um inocente. Eu não queria. Eu tava confusa... Fabiana volta a chorar. Bruna abraça a amiga. BRUNA: Calma, Fabi. Calma. Tá tudo bem agora. O pior já passou. Mas que ideia foi essa? FABIANA: Eu tava desesperada. Nada disso foi planejado, simplesmente aconteceu. O Luciano me pressionou o tempo todo. Eu me senti encurralada porque ele não queria essa criança e não ia assumir a responsabilidade. Eu também não queria, é verdade. Mas não tinha o direito de fazer isso com meu filho, e eu tinha remorso... BRUNA: O importante é que você não fez. Esquece. Já passou. Fabiana enxuga as lágrimas, afastando-se de Bruna. FABIANA: Eu nunca vi o Luciano daquele jeito, Bruna. Em momento nenhum ele se mostrou com remorso ou receio, ele só queria se livrar do problema... Era um Luciano frio, que eu não conheço. BRUNA: Ele deve tá tão desesperado quanto você. FABIANA: Não tá, não, Bruna. Pra ele tanto faz. Eu não sei como vai ser daqui pra frente... Mas eu quero o Luciano bem longe de mim. BRUNA: Isso não vai ser possível. Agora vocês têm um laço eterno. FABIANA: (chorando) Meu filho, Bruna... Eu quase matei meu filho! Fabiana chora mais ainda abraçada à Bruna. CORTA PARA Interior. Quarto Uva. LUCIANO: (muito bravo) Você não tinha o direito de se meter na minha vida desse jeito! MARCELO: (bolsa de gelo no queixo) Você vai me agradecer por isso um dia. LUCIANO: Te agradecer por ter ferrado de vez com a minha vida? Espera sentado! E a Fabiana que se vire quando essa criança nascer. Eu não vou assumir responsabilidade nenhuma com ela. Eu já tinha avisado e nosso problema seria resolvido se você e sua namoradinha não tivessem metido o bedelho aonde não deviam. MARCELO: Você não sabe o que tá dizendo. Nós livramos você e a Fabiana de cometerem um crime hediondo contra o próprio filho de vocês. Aborto é crime se você não sabe. A sorte é que os policiais aliviaram pro nosso lado por termos denunciado a clínica. Se não há essa hora você estaria atrás das grades! Luciano ignora o comentário do amigo. LUCIANO: Você tem noção do que fez? Você acabou com a minha vida, cara! Quê que eu vou fazer agora? Que futuro eu posso dar a um filho? Eu não tenho nada. E eu NÃO QUERO ESSA RESPONSABILIDADE. Sou jovem demais pra isso. MARCELO: Devia ter pensado nisso antes de ter feito o que fez. E eu não acredito que você seja tão sem caráter ao ponto de deixar a Fabiana sozinha nessa. Mostra que você é homem de verdade e assuma o que fez! O que há com você? Parece outro. Esse Luciano não é aquele que me deu a maior força pra reconhecer e assumir o que eu tava sentido de verdade e optar pelo amor da Bruna. Não é aquele que sempre me aconselhou a fazer o que era certo. Esse Luciano que tá na minha frente, eu desconheço. Marcelo sai do quarto. Luciano senta na cama passando as mãos pela cabeça, muito preocupado. | CENA 04 | Condomínio Almirante. Interior. Corredor do andar de Isabel e Suzana. MÚSICA: “Semente – Armandinho”. Igor abre a porta do apartamento 209 e aparece no corredor com uma linda cesta com buquê de rosas vermelhas, chocolates e uma champagne, toda embrulhada com um papel transparente de coraçõezinhos. Ele coloca a cesta em frente à porta do apartamento 210 e tira de dentro do bolso um cartão pregando-o na cesta. Depois disso, ele volta para dentro do apartamento 209. Suzana surge vinda do corredor buscando suas chaves dentro da bolsa e ao chegar à porta se depara com o presente. SUZANA: (estranhando) Mas o que significa isso? Suzana coloca a chave na fechadura e se abaixa para pegar o cartão. Ao abrir, lê em voz alta: “rosas vermelhas representam o fogo da nossa paixão, os chocolates são para adoçar seu coração, e a bebida representa minha devoção por ti!” Ass: Igor” Suzana não acredita no que acabara de ler e cai na gargalhada. SUZANA: Mas que versinhos de quinta! Ela abre a porta, pega a cesta no chão e entra em seu apartamento, rindo à toa. | CENA 05 | República Universitária Laços de Amizade. Interior. Quarto Maçã. BRUNA: Quer dizer que ele descobriu tudo? JANAÍNA: E da pior maneira possível, filha. Depois ele me expulsou da casa dele. BRUNA: E por que sumiu do mapa? Não deu notícias! Onde você morou esse tempo todo? Não me diga que voltou pra casa do pai do Luciano. JANAÍNA: Não, eu estava na casa da Isabel. O Carlos é o último homem que eu quero ver na face da terra. Mas as coisas na casa da Isabel também começaram complicar e eu tive que sair. BRUNA: O importante é que agora você tá aqui comigo. JANAÍNA: Eu não me perdôo por ter escondido a verdade do Darlan. BRUNA: Eu disse. Mais cedo ou mais tarde ele ia descobrir, mãe. Mentir é sempre a pior solução. JANAÍNA: (emocionada) O que mais doeu foi a maneira como ele me tratou, filha. Não parecia o Darlan por quem eu me apaixonei. Tudo bem que eu menti, mas que amor é esse que muda da água pro vinho com tanta rapidez? Ele foi frio ao extremo. Me deixou completamente no chão, humilhada. BRUNA: Tudo bem, mãe. Na hora da raiva a gente fala sem pensar, provavelmente ele já deve ter se arrependido. Se bem que o Marcelo vive me dizendo que o pai dele não é quem a gente pensa. Como se ele forçasse uma aparência pra que ninguém descubra quem ele é de verdade. JANAÍNA: Ninguém consegue fingir por tanto tempo, Bruna. O Darlan é um homem bom, eu que errei eu mentir pra ele. BRUNA: Outro dia encontramos com ele no Ponto e ele foi muito grosseiro comigo. JANAÍNA: Ele teve coragem, filha? BRUNA: Mas eu revelei, mãe. Ele tava bêbado e sofrendo muito pelo fim do relacionamento de vocês. Isso quer dizer que ele também ainda te ama. JANAÍNA: (esperançosa) Será? | CENA 06 | Escritório de Advocacia. Interior. Sala de Darlan. Darlan está atento à leitura de um processo quando o telefone fixo toca. Ele joga o processo em cima do notebook e atende a ligação. DARLAN: Pois não, Judith? (pausa) Ok. Pode mandar entrar. Ele coloca o telefone no gancho e se ajeita na cadeira cruzando os braços. Alguém bate na porta, entrando logo em seguida. Trata-se de um homem comum, alto, forte, cabelos pretos e de barba por fazer. Ele usa calça preta e blusa social azul, sem terno. Tem nas mãos uns papéis. DARLAN: E então? HOMEM: Está tudo aqui. Como o senhor pediu. O homem entrega os papéis a Darlan que analisa. DARLAN: O que ela tem feito? HOMEM: Acho melhor o senhor lê. Tem ainda o endereço novo de onde ela está morando. Darlan dá uma olhadela rápida para o papel e conclui. DARLAN: Mas é na república em que meu filho mora? HOMEM: Exatamente, senhor. DARLAN: Bom. Ótimo trabalho, meu rapaz. HOMEM: Obrigado, senhor. Com a sua licença. O homem se retira. Darlan continua a analisar o documento que recebera. | CENA 07 | República Universitária Laços de Amizade. Interior. Sala principal. Celina, Janaína, José e Bruna estão reunidos à mesa da cozinha. Bruna resolve puxar assunto. BRUNA: Quer dizer que você vai morar aqui com a gente? JANAÍNA: Sim, minha filha. Graças ao bom coração de Celina, que me deixou ficar. JOSÉ: Celina es la mejor de las mujeres! [Celina é a melhor das mulheres!] CELINA: Y tu, el mejor de los hombres. [E você, o melhor dos homens.] BRUNA: Quem não vai gostar nada disso é a enjoada da Valeska. CELINA: Como se dice aqui en Brasil, (força o português) los incomodados que se retirem! Eles riem. JANAÍNA: Eu não quero causar problemas, Celina. Se houver algum inconveniente, me diga, por favor. CELINA: No te preocupes! JOSÉ: Bueno... Entonces voy a preparar una Guacamole Mexicana para comemorar la llegada de mas una republicana a nuestra casa! BRUNA: Opa! Eu te ajudo, José. Aprendemos na faculdade uns truques muito úteis para preparar uma Guacamole no capricho. CELINA: Mientras esto, vamos a ver la reprise de la telenovela, Janaína. [Enquanto isso vamos ver a reprise da novela, Janaína.] Celina puxa Janaína pelo braço em direção a TV. | CENA 08 | São Paulo. Exterior “MÚSICA: Senhor do tempo – Charlie Brown Jr”. Sequência de cenas rápidas com sonoplastia. Fim do dia e início da noite. A lua surge no céu fazendo companhia às estrelas. Corta para... República Universitária Laços de Amizade. Interior. A câmera passeia pelos quartos dos moradores, um a um, todos estão dormindo. Transição da noite para o dia. Corta para. Jaqueline e Igor se despedem da mãe para irem à escola. Corta para. Suzana abre a porta de seu apartamento e encontra um urso de pelúcia à sua espera, do lado de fora. Ela revira os olhos, pega o presente e olha o cartão endereçado por Cláudio. Ela joga o urso de pelúcia na lata do lixo. Corta para. Café da manhã na república e a bagunça de sempre. Corta para. Bar Ponto de Encontro. Chad está tocando tamborim no balcão central, sob o olhar de reprovação de Melissa. Janaína, vestida com uniforme de garçonete, ri da situação. Corta para. Universidade Campelo Costa. Bruna e Marcelo caminham em direção à entrada, logo atrás deles está Valeska, olhando para os dois com asco. Corta para. Hospital. Celso faz sessões de fisioterapia com auxílio do doutor Humberto. O jovem tenta caminhar apoiando-se nas barras de ferro sob o olhar de Celina, Cláudio e Jaqueline. Fim da sonoplastia. Legenda: ALGUNS DIAS DEPOIS | CENA 09 | Manhã. Hospital Regional. Interior. Sala de fisioterapia. O local é bem espaçoso e ocupado por alguns aparelhos que facilitam a reabilitação de pacientes que precisam do tratamento adequado. Apoiando-se em duas barras de ferro, Celso, orientado pelo médico, tenta caminhar. Celina, Jaqueline e Cláudio estão presentes. DR. HUMBERTO: Você precisa acreditar, Celso. CELSO: Eu não vou conseguir. JAQUELINE: Vai sim, meu amor. Eu estou aqui com você. CLÁUDIO: É, cara. Você superou coisa pior. DR. HUMBERTO: Mas se não conseguir ainda, tudo bem. Tudo tem seu tempo, Celso. Celso inspira o ar e tenta sustentar-se nas próprias pernas. Com muita dificuldade ele consegue dar um pequeno passo, para surpresa de todos. CELINA: Dios mio! Él está caminando! [Meu Deus! Ele está caminhando!] Jaqueline abre um sorriso de satisfação. Celso não aguenta por muito tempo e se deixa cair entre as barras de proteção. Jaqueline, Celina e Cláudio se preocupam. O médico se aproxima do rapaz para ajudá-lo a levantar. DR. HUMBERTO: Tudo bem, Celso. Faz parte do processo. (para Cláudio) Me ajuda aqui a levantá-lo. CELSO: Eu não vejo evolução alguma, doutor. CLÁUDIO: Calma, cara. Você vai conseguir. DR. HUMBERTO: Você está reagindo muito bem, Celso. Como pode dizer que não? Eles conduzem Celso a uma cama colocando-o em cima dela. Ele está angustiado. CELSO: Eu quero voltar a andar! JAQUELINE: Você vai voltar a andar, meu amor. Tenha um pouco mais de paciência. Logo você vai sair de uma vez por todas desse hospital e voltará a ter uma vida normal, ao meu lado. Jaqueline beija os lábios do namorado. O médico observa a cena e engole em seco. | CENA 10 | Bar Ponto de Encontro. Int. O ambiente está calmo, sem movimentação de clientes. Alguns funcionários limpam e organizam as mesas no local. Melissa e Janaína conversam no balcão central. MELISSA: E a Bruna hein? JANAÍNA: Ela me ligou e disse que já tá chegando. Cê sabe como é, conciliar trabalho e faculdade não é fácil. MELISSA: Na verdade eu não sei não. Mas imagino. JANAÍNA: Melissa... Eu nem sei como agradecer a você e ao Chad. Vocês salvaram minha vida me dando esse trabalho. MELISSA: Eu e esse meu coração de manteiga derretida. E olha que eu tive que praticamente sacrificar meu casamento com Chadinho por isso. Portanto, não me decepcione hein. JANAÍNA: Ai, mas assim eu vou me sentir culpada. MELISSA: Ih! Nem vale a pena, minha filha. Aquele ali está adiando nosso casamento desde que começamos a namorar. Você foi só mais uma desculpa esfarrapada que ele encontrou pra isso. Mas não tem problema não, um dia eu visgo de vez esse peixe. As duas riem. Um barulho estranho vindo de longe interrompe a risada das duas. Close na porta de entrada do bar. Chad aparece tocando uma sequência melódica meio confusa com seu tamborim, muito empolgado. Enquanto canta um trecho do samba, faz algumas bossas com o instrumento. CHAD: Hoje a festa vai rolar, quero sambar a noite inteira... Janaína brinca. Melissa infla o peito. JANAÍNA: Tá ficando afiado hein, chefinho. MELISSA: Mas o que é que significa isso, Richarlisson? Chad faz cara de bravo por um instante. MELISSA: Já tínhamos combinado que você não ia ficar tocando essa joça aqui no bar. Vai acabar espantando os clientes. Eu hein, parece uma criança quando ganha um brinquedinho novo! JANAÍNA: E na verdade é bem por aí, não acha? CHAD: (exagerado) Releve, meu amor. RELEVE. Preciso me dedicar ao máximo e ensaiar um pouquinho mais. Em breve haverá testes para ritmista oficial na minha escola de samba. E você sabe que meu sonho sempre foi desfilar na Rosas de Ouro como ritmista oficial, MELHOR AINDA, como MESTRE DE BATERIA da “Batucada D’responsa”. Já pensou? Melissa faz cara de paisagem para Janaína. MELISSA: Tá vendo o que eu tenho que aturar, Jana? (brava/para Chad) Até semana passada seu projeto de vida era escalar o monte Everest. Agora quer virar mestre de bateria de escola de samba? Tenha santa paciência, né! Chad ignora o comentário da noiva e continua a devanear. CHAD: (empolgado) Começarei de baixo, como tem que ser. Primeiro ingresso como ritmista comum, mas logo me destacarei pelas minhas habilidades com as bossas, e quando menos esperar estarei assumindo o cargo mais alto do coração da minha escola. As notas 10 me darão o título de campeão do carnaval. Entrarei pra história do samba paulistano. Quem viver... Verá! MELISSA: Ok. Agora estoura esse balãozinho imaginário aí e volta pra realidade, meu amor. Está faltando espinafre no estoque e a Janaína estava te esperando para que você abra o caixa e ela possa retirar o dinheiro pra ir comprar. Já que NINGUÉM, e isso me inclui, tem acesso ao caixa do NOSSO bar. Absurdo! CHAD: Não é nada pessoal, my love. É apenas uma questão de segurança. Um momento Janaína. Chad se dirige até o balcão central onde guarda seu tamborim e abre o caixa, retirando uma quantia de dinheiro entregando a Janaína. JANAÍNA: Eu não demoro. Janaína caminha até a saída do bar. CORTA PARA, Exterior. Do lado de fora do Ponto de Encontro, ela acaba se trombando com Carlos que acabara de chegar ao local. Ambos ficam surpresos. CARLOS: Ora, ora, se não é Janinha Doce Prazer. Finalmente decidiu sair do esconderijo, doçura? Close em Janaína, desconfortável com a surpresa desagradável. JANAÍNA: Como você me achou aqui? CARLOS: Pra você ver, boneca. Eu nem contava com isso. Acho que era pra ser, benzinho... JANAÍNA: Me deixa em paz! Janaína tenta encerrar o assunto e sair dali. Carlos segura em seu braço com força. Ela faz cara de dor. JANAÍNA: Me solta. CARLOS: (passional) Tava sentindo falta disso, não tava? Confessa, vadia! Eu sei que tava. Ele chega bem próximo dela e lhe cheira o pescoço, excitado. Sussurra ao ouvido dela CARLOS: Eu sei que tu gostava quando eu te pegava de jeito. Janaína consegue se soltar. CARLOS: Mas agora que eu te achei tu não vai mais fugir de mim não. Tu vai voltar pra nossa casa. Vai ser tudo como era antes. JANAÍNA: Você é um doente. Eu NUNCA vou voltar a viver naquele inferno que era minha vida ao teu lado. CARLOS: (alterado/grita) É o granfino, né? Aquele corno continua contigo mesmo depois de saber quem é a bisca com quem resolveu se juntar? JANAÍNA: Então foi você que mostrou aquelas fotos? Eu sabia que tinha teu dedo imundo dessa história. Seu cretino. Por sua causa o Darlan me escorraçou da vida dele. Carlos dá uma risada assustadora. CARLOS: (debochado) Precisava ter visto a cara daquele palhaço quando viu as fotos. Ele não acreditou quando viu que a mulherzinha dele É DE TODO MUNDO! (sério/passional) Mas não é não... Não é não... DE TODO MUNDO NÃO, OUVIU BEM? TU É MINHA MULHER! SÓ MINHA. E se não for. Não vai ser de mais ninguém. Carlos se vai completamente desorientado, deixando Janaína com muito medo. JANAÍNA: Meu Deus do céu. Ele tá completamente louco. Janaína tenta se recuperar e enxuga as lágrimas que escorreram durante a conversa com Carlos. Ela respira fundo, e se concentra nas compras que tem que fazer. Caminha pela mesma calçada do bar. Um carro preto que estava estacionado ali perto começa a andar a mínima velocidade. Um casal cruza o caminho de Janaína passando pela mesma calçada, mas na direção contrária. Na outra calçada, há uma mulher passeando com seu bebê e outras pessoas caminham ali também. Janaína nota que o carro está em uma velocidade muito abaixo do normal e olha para trás desconfiando de que está sendo seguida. Ela passa a caminhar mais rápido, tentando disfarçar. Close no carro preto. Efeito câmera lenta. O vidro preto do lado do carona sendo baixado. Uma mão envolvida numa luva preta sendo posta pra fora do carro. A mão segura uma arma calibre 38 apontando-a na direção de Janaína que olha para trás mais uma vez e se desespera ao ver que está prestes a ser baleada. Fim do efeito. Ao avistarem aquela arma exposta, os passantes começam a gritar e correr. Um tiro. Janaína corre desesperadamente e acaba esbarrando com um grupo de jovens que vinha em sua direção. Outro tiro, mas esse disparo atinge um dos jovens que cai imediatamente no chão. O carro acelera e Janaína continua correndo desesperada. Novos disparos são ouvidos até que a sirene do carro da polícia espanta o carro preto que se vai. Janaína para exausta apoiando as mãos nos joelhos, respiração ofegante, tentando entender o que aconteceu. | CENA 11 | República Universitária Laços de Amizade. Interior. Sala. Celso, Jaqueline e Celina acabam de chegar da sessão de fisioterapia. Eles estão reunidos na sala. Jaqueline está sentada no sofá, Celso em sua cadeira de rodas. CELSO: Eu não quero que você fique faltando na aula pra ir me ver na sessão de ‘fisio’. Já basta eu ter perdido todo o semestre. Você tem que estudar. JAQUELINE: Eu quero enfrentar isso junto com você, Celso. Quero ficar o máximo de tempo do seu lado. E não é um grande sacrifício faltar aula. CELSO: Você diz isso agora. Mas futuramente pode se arrepender. JAQUELINE: Ok, senhor certinho. Você venceu. Vou indo então que ainda dá tempo de assistir a última aula. Jaqueline dá um beijo no namorado e quando vai sair em direção à porta lembra-se de algo. CELSO: (sorrindo) Quê que foi? Desistiu? JAQUELINE: Celso... Eu preciso te dizer uma coisa sobre o Cláudio, o meu irmão e a sua mãe. Não é justo que você não saiba e eu to me sentindo mal por ter omitido esse tempo todo. CELSO: Não consigo ver que o que esses três possam ter em comum. JAQUELINE: (constrangida) Eu nem sei como falar isso. Mas você precisa saber. CELSO: Você tá me deixando curioso... JAQUELINE: Sua mãe está mantendo um caso com o Cláudio e com o meu irmão. CELSO: (abismado) Como é que é? JAQUELINE: Olha, amor. Eu não aguentava mais esconder isso de você. No início eu duvidei do Igor, mas ele me provou que era verdade. Quanto ao Cláudio, bom, desde que a dona Suzana o conheceu no hospital que eles não se desgrudam. E pra ser sincera, sua mãe já demonstrou provas do caráter que ela tem. CELSO: É bem a cara dela mesmo... Mas como o Cláudio teve coragem de fazer isso? Na situação em que eu me encontrava. Isso não se faz, cara! JAQUELINE: E o pior é que agora os dois bobões apostaram quem consegue primeiro fazer sua mãe se apaixonar. Não é ridículo? CELSO: O Cláudio me paga. | CENA 12 | Universidade Campelo Costa. Segundo andar. Interior. Sala do curso de Administração. O professor encerra sua aula. PROFESSOR: Espero que tenha esclarecido todas as dúvidas pendentes. Como todos sabem, a primeira avaliação parcial é semana que vem. Estão liberados. Os alunos começam a arrumar seu material. Marcelo deixa o caderno cair no chão e de dentro dele sai um pedaço de papel. Do fundo da sala, Valeska diz para si mesma. VALESKA: Antes tarde do que nunca. Curioso, Marcelo examina o papel e lê o que tá escrito. MARCELO (off): Abre o olho que a santinha da Bruna de santa não tem nada! Marcelo coça a cabeça, estranhando o bilhete. MARCELO: Que palhaçada é essa?! Valeska ri sarcasticamente lá do fundo da sala. Ela levanta-se da cadeira, pega seu material, enfia na bolsa e passa por Marcelo, desfilando. VALESKA: Tá com piolho, amore? Conheço um shampoo que é tiro-e-queda. Ela passa por ele com sorriso de missão cumprida. | CENA 13 | Bar Ponto de Encontro. Interior. Janaína entra ainda ofegante em seu local de trabalho. Chad e Melissa, aflitos, correm para amparar a funcionária. CHAD: Janaína! Tá tudo bem com você? MELISSA: Que tiroteio foi esse aí fora? JANAÍNA: Eu... Eu... Não sei... MELISSA: Você não viu quem era? JANAÍNA: Uns caras num carro preto. CHAD: Estranho... Isso nunca aconteceu aqui. JANAÍNA: Eles me seguiram. Apontaram à arma pra mim. Melissa põe a mão na boca surpresa. Nesse momento chegam Bruna e Marcelo vindos da faculdade, alvoroçados. BRUNA: Quê que aconteceu lá fora? Acabou de sair uma ambulância levando alguém ferido. JANAÍNA: (desembucha) Tentaram me matar, filha. Close em Bruna, chocada. | CENA 14 | Universidade Campelo Costa. Interior. Estacionamento. Luciano está saindo do estacionamento dentro de seu carro quando Fabiana se coloca na frente dele fazendo-o frear bruscamente. Ele revira os olhos. Ela dá a volta e entra no carro, sentando-se no banco do carona. FABIANA: (séria) A gente precisa conversar. LUCIANO: (ríspido) A gente não tem mais nada pra conversar. FABIANA: Você acha que se eu tivesse alternativa eu estaria aqui falando contigo? LUCIANO: Mas você tem alternativa. Aliás, você teve mais de uma alternativa. Só que a primeira você já perdeu por causa dos seus amiguinhos. FABIANA: Você é um canalha mesmo! Como eu me arrependo de ter me envolvido com você. Em pensar que há essa hora eu podia ter feito a maior burrada da minha vida. LUCIANO: E fez, Fabiana. Você fez sim a maior burrada da sua vida. Ou você acha que desistir desse aborto foi uma atitude inteligente da sua parte? Se toca, garota. A partir de agora sua vida vai virar de cabeça pra baixo. Esse filho que você tá esperando vai acabar com todas as perspectivas e sonhos que você poderia pensar em ter. Só que EU não to disposto a abrir mão dos meus sonhos por filho nenhum e você sabe muito bem disso. Portanto, não conte comigo pra nada. Esse filho não tem pai! FABIANA: Como eu pude me enganar tanto com você? Como uma pessoa muda tanto assim? No fundo eu te amava, Luciano... LUCIANO: Ah! Não me venha com... Fabiana interrompe a fala do namorado com gritos. Ela chora. FABIANA: Em momento nenhum você pensou em mim. EU PODIA TER MORRIDO. NOSSO FILHO PODIA ESTAR MORTO AGORA. Você só queria se livrar do problema a qualquer custo. Que espécie de ser humano é você, afinal? Fabiana começa a bater em Luciano, descontrolada. Ele a contém com sua força. LUCIANO: Quer dizer que a culpa toda é minha agora? Eu não te obriguei a fazer isso, Fabiana. Você não queria esse filho tanto quanto eu. Então não venha me julgar porque de vítima nessa história você não tem nada. FABIANA: Mas eu to me sentindo culpada por isso. To arrependida. Diferente de você que se pudesse faria tudo de novo. LUCIANO: (deboche/ironia) Aah tá arrependidinha, tá? TARDE DEMAIS pra isso, garota. Porque na hora de topar fazer o aborto você não pensou duas vezes! FABIANA: Você me pressionou tanto que eu acabei cedendo num momento de desespero... Mas agora só de lembrar do que poderia ter acontecido... Só de lembrar do que eu ia ser capaz de fazer porque VOCÊ estava me deixando louca pra isso... Sinto vergonha, náusea. LUCIANO: Só que isso não muda os fatos. E quando essa criança nascer e um dia souber do que a mãezinha dela QUASE fez. Ela vai te odiar. Fabiana entra em desespero. FABIANA: VOCÊ É UM MONSTRO, LUCIANO! TANTO QUANTO SEU PAI! MÚSICA: “O que é que eu faço pra tirar você da minha cabeça – Ivo Mozart”. Luciano engole em seco a fala de Fabiana. Ela abre a porta do carro e sai de dentro dele. Luciano a olha pela última vez e suspira arrancando com o carro logo em seguida. Fabiana sente-se sem chão, sozinha no estacionamento. As lágrimas não param de cair pelo seu rosto. FABIANA: O que é que vou fazer agora, meu Deus? Ela fica ali parada, desolada e com olhar distante. Imaginando como será daqui pra frente. Fim da sonoplastia. | CENA 15 | Bar Ponto de Encontro. Interior. Janaína está sentada no balcão central com um copo de água com açúcar na mão. Chad, Melissa, Bruna e Marcelo estão ao seu redor. BRUNA: (aflita) Mas como? E por quê? JANAÍNA: Eu não sei, filha. Um carro começou a me seguir logo que eu saí do bar e quem tava dentro começou a atirar. O tiro pegou num rapaz, mas era pra mim. Eu sei que era porque eles me seguiram e apontaram à arma pra mim. Foi por pouco. MARCELO: Mas quem faria uma coisa dessas com você? MELISSA: Você tem inimigos, Jana? CHAD: Gente, ela saiu daqui com uma quantia em dinheiro. Deve ter sido um assalto. MELISSA: Como assalto, amor? Só eu, você e ela sabíamos que ela tava com dinheiro. Não tinha ninguém aqui. E nem era tanto dinheiro assim vai. JANAÍNA: Não foi assalto, Chad. Tentaram me matar. E eu acho que sei quem foi. Close em Janaína, séria. | CENA 16 | Noite. República Universitária Laços de Amizade. Interior. Sala de estar. Hora do jantar. “MÚSICA: Em busca da fé – Chimarruts”. Celso, em sua cadeira de rodas, espera o jantar ser servido. Celina e Marcelo colocam os pratos na mesa enquanto José mexe uma panela no fogão. CELSO: Alguém sabe o paradeiro do Cláudio? MARCELO: Não o vi o dia todo. CELSO: Hum. E esse rango sai, ou não sai, José? JOSÉ: Calma, jóvene. La prisa es enemiga de la perfección. [Calma, rapaz. A pressa é inimiga da perfeição.] MARCELO: Ê vida boa essa sua hein, Celso? Não precisar ter que fazer nada, só esperando tudo cair em suas mãos. CELSO: Nem tão boa assim, Marcelo. MARCELO: Foi mal, cara. Eu não queria ser insensível. CELSO: Tudo bem. MARCELO: Por falar nisso. Como está se saindo na fisioterapia? CELSO: O doutor Humberto acha que eu tenho chances. Mas, sei lá. CELINA: Si el médico dijo, está dicho. Volverás a caminar, muchacho. Hay que tener fé. [Se o médico disse, está dito. Você vai voltar a caminhar, rapaz. Tem que ter fé.] CELSO: Tô me esforçando. CELINA: Y para comemorar tu regresso a nuestra casa, José está haciendo la mejor Paella mexicana. [E para comemorar sua volta a nossa casa, José está fazendo a melhor Paella mexicana.] CELSO: Vou logo avisando. Eu sou exigente hein. JOSÉ: Dejarás de ser así que probes mi paella. [Você deixará de ser, assim que provar da minha Paella.] Risos. Valeska surge na cozinha, vinda de seu quarto. VALESKA: Já podemos jantar. CELINA: Y tu hermana? [E sua irmã?] VALESKA: Disse que não tá com fome. CELINA: ¿Qué pasa com ella, chica? Hace tiempo Vanessa ya no es la misma. [O que está acontecendo com ela, menina? Faz tempo que Vanessa já não é mais a mesma.] VALESKA: Achei que só eu tinha percebido isso. Mas, ultimamente a Vanessa anda muito antissocial mesmo. Eu não sei o que tá acontecendo até porque ela nunca me fala nada da vida dela. Sempre foi assim. MARCELO: Talvez ela nunca tenha encontrado espaço em meio a seu ego tamanho G. Valeska põe a mão no peito fazendo-se de ofendida. VALESKA: Quanto ódio nesse coraçãozinho, amore. Quê que eu te fiz, hein? CELSO: Ih não comecem, pessoal. VALESKA: Por acaso tá descontando em mim a raiva que tá sentindo de alguém? MARCELO: Quê que você tá querendo dizer com isso? VALESKA: Nada. Só que de repente, você poderia ter tido um dia ruim, sei lá. Algo inusitado poderia ter acontecido e tirado sua paciência. Nunca se sabe né! Marcelo lança um olhar cortante para Valeska, matando a charada. MARCELO: Foi você, não foi? VALESKA: Não sei do que você está falando... MARCELO: (bravo) Foi você quem... (hesita) Vem aqui. Quero falar a sós contigo. Marcelo segue em direção à sala. VALESKA: (cínica) Adoooro falar a sós com você. Ela vai logo em seguida. Celina e Celso trocam um olhar. CELSO: Valeska é um caso perdido. CELINA: (portunhol) Quizá! Mas su hermana sei que no es. Então voy a verla e intentar descobrir qué está acontecendo. [Talvez! Mas sua irmã, sei que não é.] | CENA 17 | Condomínio Almirante. Exterior. Fachada do prédio. O portão está fechado e não há movimentação aparente no local. Posicionados na calçada do condomínio estão Cláudio e dois indivíduos, um magro e alto, o outro, gordo e alto. Os três vestem roupas nada convencionais, trajes típicos de Mariachis mexicanos. Cláudio tem nas mãos uma viola e usa um bigode falso ridículo. Os outros dois tentam afinar os violinos que levam. CLÁUDIO: Ae rapaziada. Valeu pela força hein. ‘Vamo’ fazer tudo como o José mandou. Hoje eu conquisto o coração dessa dama de ferro. Só que não. Os três riem, debochados. Corta para. Condomínio Almirante. Apartamento 210. Interior. Quarto de Suzana. Debaixo do edredom estão Suzana e Igor, abraçados. IGOR: Depois dessa, nem preciso perguntar se você curtiu as flores que te mandei, né? Suzana começa a ri de tal maneira que tiraria a paciência do ser humano mais calmo do mundo. SUZANA: Então foi você que me mandou aquelas flores mixurucas? IGOR: Quê que foi? Não gostou? E o poema? Eu mesmo escrevi, se quer saber. Suzana exagera no deboche. Igor perde a paciência. IGOR: Qual é a sua? Toda mulher gosta dessas baboseiras! SUZANA: (rindo muito) Seus versinhos pareciam terem sido escritos por uma garotinha da escola primária. Suzana não consegue conter a risada. Igor está irado. SUZANA: O que você pretendia com isso, afinal? IGOR: (desconfiado) Nada, ué. Só queria te agradar. Suzana respira fundo e se recompõe. SUZANA: (desconfiada) Sei... Escute aqui, rapazinho... Ele a interrompe grosseiramente. IGOR: Eu DETESTO quando você se refere a mim no diminutivo. SUZANA: (maliciosa) Não seria por que isso lhe remete a algo que você tem e que também é muito pequenininho, seria? IGOR: (altamente ofendido) EU NÃO ADMITO QUE VOCÊ FALE ASSIM DO MEU... SUZANA: Calminha, bebê. Quem está falando é você... Igor bufa de raiva. Emburrado, ele tira o edredom de cima de si e senta-se na cama para se vestir. Suzana, apenas de camisola de seda preta, o agarra por trás. SUZANA: Ficou bravinho, amor? Eu sei como fazer isso passar... (sussurra em seu ouvido) Ainda não estou satisfeita. Ela começa a acariciá-lo em seu peitoral e a beijá-lo no pescoço. Ele começa a se render às carícias dela dando uma risada safada. IGOR: Não me provoca. SUZANA: Me mostra do que você é capaz. Neste momento um som desafinado, ao fundo, tira a concentração do casal. SUZANA: Mas o que é isso? IGOR: Parece que tá vindo lá de fora. Suzana se levanta imediatamente em direção à janela do quarto que dá vista para o terraço. Ao abri-la, se surpreende com o que vê lá em baixo, na calçada da entrada de seu edifício. Close em Cláudio e seus amigos. O trio de músicos amadores começa a tocar a canção “Bésame mucho” [clássico mexicano dos anos 40]. Cláudio solta a voz. Os poucos passantes estranham aquela movimentação e há quem xingue os ridículos. Ele aumenta o tom de voz despertando a curiosidade dos moradores do local. Alguns começam a abrir suas janelas. Ao perceber Suzana admirando a cantoria, Cláudio abre um sorriso falso. Close em Suzana, perplexa. SUZANA: Eu devo ter tacado fogo na cruz! Só pode! Close em Cláudio pegando um buquê de flores que estava no chão e oferecendo-o à Suzana, que sorri falsamente. Ela desaparece da janela. CLÁUDIO: Ela caiu feito um patinho, galera. Sirenes de polícias se aproximam do local rapidamente. Uma viatura estaciona perto da calçada do condomínio e dois policiais saem imediatamente, com cara de bravos e cacetetes nas mãos. Um deles toma a palavra. POLICIAL: Recebemos uma denúncia contra baderneiros que estão perturbando a ordem pública. Alguém confirma? Close em Cláudio, tenso. Close na janela de Suzana. Ela aparece rindo da situação. CLÁUDIO: Eu posso explicar, seu policial. POLICIAL: Vai explicar pro delegado. Na delegacia. Cláudio olha para o andar de Suzana, onde ela está debochando do rapaz. Igor surge por trás da amante. IGOR: Se deu mal, hein...! CLÁUDIO: Seu filho da mãe! POLICIAL: Os três, no camburão. Agora! | CENA 18 | Bar Ponto de Encontro. Interior. Cozinha. Bruna corta algumas verduras com muita habilidade, sob o olhar de Janaína. JANAÍNA: Você gosta mesmo de cozinhar né, filha? BRUNA: (sem tirar o olho das verduras) É o que eu mais gosto de fazer na vida. É como uma terapia, mãe. Bruna conduz a tábua com as verduras em direção à panela que cozinhava no fogão. Ela despeja as verduras na comida e volta à mesa. JANAÍNA: Você lembra quando sua vó cozinhava e você se metia pedindo pra ajudar? Acabava inventando moda e fazendo a maior bagunça. BRUNA: Mas sempre acabava dando certo, né? JANAÍNA: Você tem talento pra isso. O clima nostálgico cessa quando Janaína fica séria. BRUNA: Quê que foi, hein? O pior já passou mãe. JANAÍNA: Eu to com medo, Bruna. O Carlos vai tentar de novo. BRUNA: Você nem tem certeza se foi ele mesmo. Aliás, quem garante que foi mesmo um atentado? JANAÍNA: Minutos antes de acontecer, eu encontrei com o Carlos na saída do bar, filha. Só pode ter sido ele. BRUNA: Se vocês se encontraram minutos antes, como ele teve tempo de entrar num carro, colocar uma luva e atirar em você? Não faz sentido. JANAÍNA: Você não conhece aquele homem. Ele é capaz de tudo. BRUNA: Calma. Você tá impressionada com isso tudo. Vai ficar tudo bem. Janaína olha com aflição à filha, que retribui o olhar. JANAÍNA: Se me acontecer alguma coisa... Promete que vai ser feliz, e me perdoar por não ter sido a mãe que você merecia? BRUNA: Não diz besteira. Não vai acontecer nada com você. Bruna dá a volta na mesa para abraçar a mãe, que se sente protegida. Close na porta da entrada da cozinha e Melissa entrando no recinto, assustando as duas. MELISSA: Oh que lindinho o momento fraternal entre mãe e filha. Mas Bruna, o pedido da mesa 10 já está pronto, querida? BRUNA: Sim. Só um momento Melissa. | CENA 19 | Condomínio Almirante. Apartamento 209. Interior. Sala de estar. Jaqueline surge vinda de seu quarto em direção à sala. Desconfiada, ela caminha para o corredor. Corta para. Interior. Quarto de Isabel. Jaqueline abre a porta do quarto lentamente certificando-se de que a mãe não está. Ela adentra ao recinto e começa a procurar por algo em todos os móveis do quarto. Ela abre o guarda-roupas, tira umas caixas verificando o que tem dentro, devolve-as em seguida. Abre as gavetas revistando as roupas da mãe. Vai até uma cômoda próxima à cama abrindo as duas gavetas. Ao abrir a gaveta de baixo ela nota algo estranho, enrolado em um pano. Imediatamente a garota desenrola e se assusta ao ver uma arma calibre 38. O barulho de porta batendo deixa Jaqueline aflita. JAQUELINE: Droga...! Isabel abre a porta de seu quarto e se surpreende ao ver a filha ali. ISABEL: O que você está fazendo no meu quarto, filha? Jaqueline vira-se para a mãe. Seu semblante agora é desafiador. JAQUELINE: Por que você guarda uma arma no quarto, mãe? Close em Isabel, encurralada. |
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autor Diogo de Castro
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