A Praia
de Rebeca Franklim
Estava a caminho da praia,
enquanto escutava algum rock pesado no fone, e tentava contar cada uma das
minhas pedaladas, era um final de tarde, sol já estava baixando e tudo que eu
queria era ficar longe de todos por um tempo, me sentir longe do mundo também,
acho que as vezes é necessário para eu não cometer um surto e fazer algo que
não quero ou não pensei bem. Desci a escada do calçadão que ligava a areia e me
sentei, peguei na minha mochila um baseado que eu ainda tinha da noite passada,
acendi e coloquei na minha playlist aleatória, e começou a tocar “Time to
Pretend” do MGMT. Uma boa pedida, se eu fosse escolher. Minha mãe sempre me diz
que um dia meus miolos vão fritar de tanto que eu fumo um. Eu estava tentando
me desestressar um pouco dentro do meu quarto e ela me pegou fumando, não tive
o que fazer, nem como negar, só dizer a verdade e não tem nada demais né?
Ainda que eu tivesse ido à
praia mais longe, parece que a noite passada ainda continuava acontecendo
várias e várias vezes na minha cabeça. Eu nunca imaginei que a Larissa poderia
fazer isso comigo. Com o meu melhor amigo, o que machuca muitas vezes não é o
ato da traição e sim a mentira que vai criando uma bola de neve na vida de
todos que estão incluídos. Principalmente no que é o último a saber.
De repente alguém
atrapalhou os meus pensamentos. Apareceu na minha frente uma menina meio baixa
e ela acenava e falava algo enquanto sorria e eu só então percebi que a música
estava estourando os meus ouvidos. Ela estava sorrindo e enquanto a boca se alargava
os olhos dela fechavam um pouco e não dava pra distinguir bem qual era a cor
deles. O cabelo dela era raspado dos lados e embaixo, era escuro, mas a pele
era bem branca. Seu rosto era magro e seu corpo também, ela vestia uma camiseta
de botão que estava aberta, com um biquíni e um short, estava com uma mochila
nas costas e segurava um skate na mão direita.
Eu tirei um lado do meu
fone e ela estava me perguntando alguma coisa.
-Ah, oi, desculpa eu
estava ouvindo uma música.
-Eu percebi.. Eu vi você parada
e por aqui é difícil ver alguém sozinho na praia, as pessoas costumam andar em
bandos.
-hum. Eu aprecio a minha companhia
mesmo.
Ela ficou calada durante
um tempo e acho que percebeu que eu não estava muito na vibe de conversar e
realmente não estava, fugi de tudo para estar sozinha e não ter que conversar
com mais ninguém.
-Posso me sentar aqui?
Ela disse isso já sentando na areia e então eu
ofereci o baseado e ela recusou.
-Moro perto daqui e se eu
chegar com cheiro de maconha em casa, meus pais não vão gostar muito.
Assenti com a cabeça e
fiquei olhando para o mar, as ondas vinham e iam, o sol já dando adeus e o
clima já esfriando.
-O que você estava ouvindo
quando eu cheguei?
-time to pretend.
-MGMT, essa banda é bem
psicodélica, e parece que te faz viajar entre universos paralelos.
Fiquei olhando pra ela
enquanto ela dizia isso, e sorri, pois era exatamente isso que eu achava
também.
-Você mora por aqui? Eu
nunca te vi e sempre estou pela praia ou pelo calçadão no skate.
Dei uma risadinha.. pois
com a cor daquela menina a última coisa que parecia era que ela estava
constantemente na praia.
-Não, moro um pouco longe
e tenho certeza que se eu já tivesse visto alguém como você, eu teria reparado.
-Alguém como eu?
-É, como você.
-Me chamo Helena, mas pode
me chamar de Lena.
-Maria, pode me chamar de
Maria mesmo.
Um silêncio pairou no ar,
até que Lena começou a puxar assunto comigo sobre o que eu gostava de fazer,
ouvir e esses tipos de coisa. Meio a contragosto fui respondendo e ficando
interessada pra saber dela também, ela era do tipo que mais perguntava do que
respondia. E conforme a noite foi se fazendo presente, Lena continuou a puxar
assunto como se quisesse de fato me conhecer, e eu fui adentrando no universo
dela, esquecendo de fato do motivo pelo qual eu queria estar longe de todos, e
me permiti conhecer um pouco daquela garota tão atraente e diferente. Lena
então levantou no meio de uma conversa entre plantas e livros e disse que havia
perdido a hora e que tinha que ir embora. Então me levantei também meio devagar
não querendo ir, mas ao mesmo tempo sabendo que uma hora teria que ir para casa
e encarar a realidade.
E então eu me peguei
vidrada olhando para os olhos dela e ela permaneceu o olhar no meu também, eu
andei com os meus olhos ao redor do rosto dela, querendo memorizar cada traço
do nariz, da sua boca, a forma como seu pescoço se alongava pra cima, e o modo
como os cabelos dela iam ao contrário do vento, e ela com a mão esquerda
tentava o controlar..
No meio do meu êxtase ela
disse:
-Eu tenho uma festa pra ir
hoje, de alguns amigos meus da faculdade, se você quiser ir também.
-Não, não mesmo, eu não
estou muito no clima de festa, mas obrigada pelo convite.
-Eu tenho tenho que ir,
mesmo.. Prazer em te conhecer Maria, até mais.
E então ela saiu correndo
e subiu nas escadas que levavam direto para o calçadão, subiu no skate e foi
remando até eu a perdesse de vista. Ainda estava sentindo o cheiro dela, que
pairava pelo ar, um cheiro que não era de perfume específico, mas aquele
natural que algumas pessoas possuem..
Tratei de ir pegar minha
bike que havia deixado encostada no quiosque, com um cara que foi bem simpático
comigo, ao dizer que eu podia deixar ali. Agradeci e então montei na bike,
coloquei meu fone e fui. Durante o caminho minha mente ainda estava naquela
praia e na menina da qual eu tinha acabado de conhecer e não me escapava da
mente, era como se a voz dela estivesse ecoando ainda em minha cabeça e o seu
sorriso estive dando looping e me fez sorrir também automaticamente. Na minha playlist
aleatória começou uma melodia de uma música da qual eu conhecia bem e sorri
para mim e comecei a cantarolar junto com Cícero.
Na onda leve da brisa do dia
Na onda longa do trem
Na brisa leve da vida do dia
Eu encontrei o meu bem...
Quando cheguei a casa,
Malu, uma amiga minha estava sentada no sofá conversando com minha mãe e estava
arrumada.
-O que você está fazendo
aqui?
-Oi para você também
Maria, eu estava dizendo pra sua mãe que a gente tinha marcado de ir juntas
aquela festa de hoje, lembra?
-Que festa?
- Você deve ter se
esquecido, vamos ao seu quarto que eu vou te esperar tomar banho e se arrumar.
Malu foi me empurrando em
direção ao meu quarto e então fechou a porta atrás dela.
-Você não vai entrar num
buraco por causa da Larissa, vamos, uns amigos de outra faculdade me chamaram
pra ir a uma festa hoje, e eu quero você como minha companhia.
Eu pensei em começar a
dizer a Malu que eu não queria ir à festa alguma, mas eu sei o quanto ela pode
ser persistente e persuasiva quando quer, e então pra evitar, peguei minha
toalha e entrei logo no banho. Vesti uma camiseta qualquer de banda, uma
bermuda, um all star e lá fui arrastada por Malu, pra essa tal festa. No
caminho, ela ia me dando conselhos que eu nem ao menos pedi, sobre como superar
um término juntamente com uma traição e eu então liguei o rádio numa música
qualquer que estava passando, pra ela entender o recado. Chegamos a festa e era
um pouco longe, do tipo de rolê que estávamos acostumadas a ir. Quando entramos
Malu foi logo reconhecendo uma galera, que deveria ser os amigos que ela havia
falado, e então eu disse a ela que iria dar uma volta pra ver as pessoas.
Enquanto eu circulava pela casa que era um pouco grande, parei na cozinha e fui
pegar algo pra beber, reencostei no balcão e desci a vodka pura em um gole só,
quando alguém estava do meu lado dizendo:
-Você vai passar mal se continuar bebendo
dessa forma.
Eu reconheci essa voz no
mesmo instante, quando levantei a cabeça e olhei para o lado, lá estava ela,
Lena. Sorrindo pra mim com o mesmo sorriso de hoje cedo, o sorriso largo que
parece que pode carregar qualquer alegria ali, aqueles olhos me fitando até o
fundo da minha alma e então senti que a vodka ia embrulhando meu estômago
juntamente com aquelas malditas borboletas.
Na onda longa do trem
Na brisa leve da vida do dia
Eu encontrei o meu bem...
Bruno Olsen
Cristina Ravela
Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.
REALIZAÇÃO
Copyright © 2021 - WebTV
www.redewtv.com
Comentários:
0 comentários: