Coração Grande
de Karine Dias Oliveira
A proximidade do Natal já não tinha mais sentido... era assim que Luciana pensava.
Aquela
movimentação para ornamentar a frente da casa, o tal pinheiro que resistia há
anos no velho vaso de barro feito pelo bisavô no forno da fazenda, a corrida
aos supermercados, as encomendas aos vendedores de doces caseiros, as compras
dos presentes e até das roupas novas já não faziam os seus olhos brilharem.
Aquele
ano, realmente, seria diferente dos anteriores.
Os
temperos tinham sido colhidos ou comprados na feira, porém o ato de movê-los não tinha graça...
não tinha aquele cheirinho gostoso... não atraía o seu paladar para as delícias
que poderiam recebê-los.
Aos
quinze dias do mês de dezembro daquele ano, a adolescente já se mostrava
ansiosa em contagem regressiva para ver a avó Nina. Uma “vó” muito carinhosa,
que gostava da casa cheia e que recebia a família com café quentinho e bolo
feito lá no forno... o mesmo onde o seu pai preparava os vasos de barro para
aconchegar os pinheirinhos.
Dona
Nina sempre foi uma pessoa saudável e só ia ao médico quando as enfermeiras da
comunidade solicitavam que ela tomasse alguma vacina ou fizesse exames de
rotina (só por precaução), mas demorava pra ir ao postinho da comunidade e, por
vezes, “fugia” dos tais exames. Era uma morena bonita, de pele lisinha... mistura de índia com
português. Daí, vinha toda essa coisa de amar festejos natalinos e apreciar uma
culinária bem feita.
No
entanto, em um desses exames de rotina, a avó de Luciana descobriu que tinha um “coração
grande”.
Mas,
o que era ter um “coração grande” para uma adolescente de dezesseis anos?
Bom...
sempre ouvia falar que pessoas boas têm o coração grande, mas nunca soube que
isso seria tão ruim pra sua vozinha querida.
Pois
é... coisas da vida que não se explicam. Coisas que se vivem se descobrem e
causam uma dor enorme.
O
tal “coração grande” já não fazia a avó viver com saúde. Os seus passos já não
eram os mesmos, a respiração ofegante a impedia de andar pela fazenda, tratar
dos animais, molhar a horta e até de banhar-se no riacho. Parece que esse
negócio que o médico descobriu, poderia ser o sinal de algo muito prejudicial
para qualquer pessoa (independente da idade). O pior é que essa revelação
aconteceu só agora e tinha que ser resolvida, o mais breve possível.
A
família toda se envolveu. O caso era sério e somente um milagre poderia salvar
a Dona Nina que já passava dos seus setenta e tantos anos. Seria uma bênção...
o melhor presente que Deus Pai poderia dar a uma pessoa como ela.
Ela
não se entregou! Sempre presenteava a família com um sorriso e palavras de
carinho. A serenidade em seu olhar era incrível! Como alguém com um caso tão
crítico ainda poderia acolher os aflitos?
Seria
ironia do destino... uma pessoa como essa, que sempre teve um coração que
abraça o mundo, agora sofrer com um problema tão grave?
Luciana
pensava nisso todos os dias. Perguntava pra Deus... rogava... implorava...
agradecia os sorrisos que recebia da avó. Tinha fé.
A
vida já não era a mesma, porque em uma semana tiveram que levar a Dona Nina
para o hospital em outra cidade onde havia um especialista.
Doutor
Roberto tornou-se um amigo da família e buscou inúmeras alternativas que
pudessem prolongar a vida da idosa. Entre muitos estudos e contatos com outros
profissionais, decidiram que a saída seria a cirurgia.
Enfim, a data estava marcada
para depois da virada do ano novo e os médicos comunicaram à família que as
condições eram suficientes para esta submissão.
No
entanto, não tinha clima nenhum para um festejo natalino sem a presença da Dona
Nina.
Foi
aí que Luciana teve uma ideia!
Já
que ela não poderia estar em sua casa, com as suas coisas e comemorando o
nascimento de Jesus... a família invadiria o quarto do hospital.
Mas,
como isso aconteceria?
Luciana
combinou com os médicos e colocou um grande telão no quarto onde já estava
internada e recebendo os cuidados para a cirurgia. Conectou-o telão à internet
e não se esqueceu de levar o velho pinheiro. Fez isso tudo, enquanto as
enfermeiras conduziram a avó para mais um exame em outro andar do hospital.
Aquela
noite não poderia ser mais uma noite solitária com algum acompanhante da
família... afinal, a Dona Nina merecia muito mais!
Quando
a avó entrou no quarto... uma luz diferente foi acesa, no telão começaram a
aparecer cenas da fazenda e a emoção rolou pelos olhos... desciam recordações
que eram amparadas pelas suas mãos macias.
Foi
tudo muito leve, especial... nada que a fizesse se exaltar diante de tanto
carinho. Não que ela não se emocionasse com facilidade! Porém, era uma pessoa
tão serena que gostava de apreciar, ouvir, observar e viver os momentos na
lucidez de sua personalidade.
O
abraço não poderia faltar e, foi isso que a adolescente fez! Abraçou a avó com
cuidado... como se estivesse envolvendo os seus braços em uma jóia rara, frágil
e de beleza inigualável. Olharam-se por longos segundos... conversando por
carícias entre as suas faces. Carinhos que ficariam registrados nas memórias de
ambas.
O
pinheiro foi testemunha de mais um evento de amor.
Ficou ali... rejuvenescido e parecendo estar alegre ao movimentar os seus galhos com a leve brisa, que entrou pela janela. Brisa que parecia dançar ao som dos sinos da igreja matriz, enquanto o padre dava a bênção.
Francisco Caetano
Gisela Lopes Peçanha
Lígia Diniz Donega
Márcio André Silva Garcia
Paulo Luís Ferreira
Pedro Panhoca
Rossidê Rodrigues Machado
Bruno Olsen
Cristina Ravela
Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.
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