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Terra da Garoa: Capítulo 09

Novela de Édy Dutra
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TERRA DA GAROA - CAPÍTULO 09
 


CENAS DO CAPÍTULO ANTERIOR


MARIA
 ALICE (apreensiva): - Do que você está falando, Donato?

DONATO: - Estou falando que eu voltei para esclarecer a mentira que você e o Gurgel mantiveram até hoje.

MARIA ALICE: - Você não ouse!

DONATO: - Eu vim atrás do Humberto, Maria Alice. Voltei para abraçar o meu filho.

Donato e Maria Alice se encaram.



CENA 01. CEMITÉRIO. INT / EXT. DIA.

Continuação do capítulo anterior. Maria Alice reencontra Donato. Os dois discutem.

MARIA ALICE: - Você não ouse, Donato, se aproximar do meu filho! Não ouse!

Donato ri, debochado.

DONATO: - Alice... Não se iluda. Você não precisa disso. (sério) O Humberto não carrega o seu sangue. E nem o sangue do meu falecido irmão.

MARIA ALICE (apreensiva): - Vá embora, Donato. Pelo amor de Deus!

DONATO: - Ir embora sem abraçar o meu filho? Não! Eu voltei pra ficar, Alice. Até porque, Gurgel com certeza preparou um bom testamento. Avarento que só ele... Mas eu acredito que ele deva ter se lembrado do irmão aqui.

MARIA ALICE: - Depois que você foi embora, ele nunca mais tocou no seu nome. Pra ele, você morreu, Donato.

DONATO: - Engraçado que foi ele quem morreu pra mim. Literalmente, pra nós todos.

MARIA ALICE: - Como você ficou sabendo disso?

DONATO: - Da morte do meu irmão? Está em todos os jornais deste país.

MARIA ALICE: - Eu falo do Humberto.

DONATO: - Ela me disse.

Maria Alice se choca.

DONATO: - É questão de pouco tempo para eu abraçar meu filho, Alice. E ninguém vai me privar disso mais. A única pessoa que fez isso, hoje será enterrada neste cemitério.

MARIA ALICE: - Você antes me disse que sua volta era um ato de coragem. Mas não me convenceu, Donato. Esperou o irmão morrer para poder encarar a verdade. Você não passa de um covarde. Um covarde!

Neste instante, na porta da capela, Tarsila chama por Maria Alice.

TARSILA: - Maria Alice!

Maria Alice vira-se para a amiga, acena, sinalizando que já retorna para a capela. Ao virar-se novamente para Donato, percebe que o mesmo já não se encontra ali.

Donato segue caminhando por entre os túmulos do cemitério, em direção ao portão da saída. Ao lado do portão, uma moça (loira, cabelos lisos, expressão angelical, 25 anos) o aguarda.

DONATO: - Vamos embora, minha filha.

MOÇA: - Mas o senhor não ia ficar pro enterro, pai?

DONATO: - Não... Talvez eu seja mesmo um covarde.

MOÇA: - Como é?

DONATO: - Nada não, Liza...

LIZA: - A gente veio até aqui pra quê então?

DONATO: - Eu precisava fazer um acerto de contas. Na verdade ainda preciso, mas não tem como ser agora, como eu pensava. Mas será em hoje...

LIZA: - O que você vai fazer, pai?

DONATO: - Vou por às claras algumas coisas que estão ocultas, filha.

Donato e Liza saem.

CENA 02. CEMITÉRIO. INT. DIA.

O cortejo com o caixão de Gurgel segue em direção ao local onde ele será sepultado. Tarsila caminha ao lado de Maria Alice.

TARSILA: - Quem era aquele homem que conversava com você, Maria Alice?

MARIA ALICE: - Era o Donato, irmão do Gurgel.

TARSILA (surpresa): - Aquele que você me falou?!

MARIA ALICE: - O próprio... Disse que voltou para ficar. Meu Deus, isso vai ser um tormento, eu já estou sentindo.

HUMBERTO (a si mesmo): - Esse inferno não termina? Joga esse corpo em qualquer buraco aí e pronto...

BARRETO: - Orando, Humberto?

HUMBERTO: - Ah, sim! Pela alma do meu querido pai. Que descanse em paz.

BARRETO: - Foi um grande homem. Pena seu irmão não poder estar aqui neste momento, prestando a homenagem dele ao seu pai.

CENA 03. AVIÃO. INT. DIA.

Henrique está sentado na poltrona que dá para a janela do avião. Olhando o horizonte, ele chora, triste, pela morte do pai.

CENA 04. PORTUGAL. CENTRO DE ESTUDOS. INT. DIA.

Joaquim surpreende Raquel.

JOAQUIM: - Eu te amo desde a primeira vez que eu te vi, Raquel. Nunca senti isso antes. (pega a mão de Raquel e coloca em seu peito) Meu coração pulsa forte só de pensar em ti, no seu jeito, no seu perfume...

RAQUEL (solta-se): - Joaquim! Eu nem sei o que dizer pra você...

JOAQUIM: - Diga que sim! Que me aceita, oras!

RAQUEL: - Eu não posso fazer isso!... Meu coração está junto com o Henrique, indo para o Brasil também.

JOAQUIM: - Não faça isso comigo, Raquel! Só estou te pedindo uma chance para te conquistar...

RAQUEL: - Eu não posso aceitar o seu amor, Joaquim! Não posso fazer isso com você, te iludir e nem trair o amor do Henrique.

JOAQUIM: - Eu não me importo de me iludir, desde que seja em seus braços, na doçura dos seus olhos, tocando seus lábios... você acha mesmo que ele te ama assim, de verdade?

RAQUEL (se afasta): - Não, Joaquim, para, por favor.

JOAQUIM: - Desculpa. Me perdoa. Eu não queria te deixar desconfortável. Só quero que saibas que eu te amo, Raquel; E que não vou desistir do seu amor. Não vou mesmo.

Joaquim sai. Raquel fica pensativa.

CENA 05. ITACLUBE. ESCRITÓRIO. INT. DIA.

Macedão e Carlos conversam.

CARLOS: - Então estamos acertados assim?

MACEDÃO: - Tudo bem, doutor. Por mim ta ok. Parceria firmada.

CARLOS: - Tenho certeza de que estamos fazendo um grande negócios. Esses jogadores serão muito bem valorizados pelo futebol que jogam aqui.

MACEDÃO: - Eu só não sei por que não o senhor não pode levar os dois logo de uma vez? Por que precisa ser primeiro o Daniel e depois o Marcelo?

CARLOS: - Faz parte do processo, Macedão. E o Cortinthians está procurando um atacante bom no momento. Mas eu já vou abrindo os caminhos para que o Marcelo seja levado também, afinal, é um meio-campista dos melhores que eu já vi!

MACEDÃO: - Se é assim, pela necessidade do clube, está tudo certo.

Os dois se cumprimentam.

CENA 06. ITACLUBE. ALOJAMENTO. QUARTO DANIEL E MARCELO. INT. DIA.

Os dois trocam de roupa, após o treino.

MARCELO: - Você viu que o empresário aquele estava aí?

DANIEL: - Vi sim! Ele disse que viria e cumpriu.

MARCELO: - Você conhece ele?

DANIEL: - Encontrei ele naquela festa chique que eu fui com a Jaque.

MARCELO: - Sei... E o que ele disse?

DANIEL: - Nada de mais. Apenas que viria no treino. Espero mesmo que tenha gostado do meu futebol.

MARCELO: - Hoje você não foi dos melhores não, Daniel. Já teve dias bem mais gloriosos nesse campo aí.

DANIEL: - Você acha mesmo, Marcelo?

MARCELO: - Claro! Joguei três bolas pra você na cara do gol e você perdeu as três. Os caras se ligam nessas aí.

DANIEL: - Mas depois fiz quatro gols. Talvez ele se ligue nisso também.

Marcelo encara Daniel com desdém. Daniel termina de se arrumar, cumprimenta Marcelo com um tapa nas costas e sai do quarto.

MARCELO: - Se liga que você vai mofar no Itaclube, Daniel. Essa é a minha chance.

CENA 07. CASA QUEIROZ. SALA DE ESTAR. INT. DIA.

Maria Alice e Humberto recebem o cumprimento de amigos pelo enterro de Gurgel. Num dos pontos da sala, Stefany e Nuno conversam.

STEFANY: - Sinceramente, não sei porque a gente veio pra cá. Nem no enterro a gente foi. Não precisava vir aqui também.

NUNO: - Papai pediu, né, Stefany. E é também uma questão de respeito. Falando assim até parece que você nem conhecia o Gurgel.

STEFANY: - Ai, não to desrespeitando não, tá legal? Só acho que a gente poderia estar fazendo algo muito mais bacana do que vir aqui após um enterro. A Maria Alice está com a cara péssima, louca para descansar e essa gente toda aqui...

NUNO: - Isso é verdade. Ela está cansada. Já o Humberto, não parece tão incomodado.

STEFANY: - Mas eu já estou incomodada. Marquei salão para logo mais e não posso perder a hora.

Stefany se aproxima de Barreto.

STEFANY: - Pai, eu preciso que você me leve embora daqui a pouco. Não posso perder o salão.

BARRETO: - Não acredito que você marcou salão justo hoje, Stefany, no dia do enterro de um amigo da família.

STEFANY: - Pai, eu não tenho bola de cristal! Nunca que eu iria imaginar que o Gurgel iria esticar as canelas hoje, né? Ai, vamos! É rapidinho! Depois o senhor volta...

BARRETO: - Tá certo, depois eu levo. Depois...

Humberto se aproxima de Maria Alice.

MARIA ALICE: - Agora somos só eu, você e seu irmão.

HUMBERTO: - Só nós, mamãe. Mas vamos seguindo a vida. Eu vou dirigir a empresa, continuar levando nossos negócios, como meu pai sempre quis.

MARIA ALICE: - Eu sei que vai, meu filho. O seu pai ficaria muito (pausa)

HUMBERTO: - O que tem meu pai, mãe? Como ele ficaria?

MARIA ALICE: - Eu não acredito...

HUMBERTO: - O que foi mãe?

Maria Alice com os olhos fixos na porta. Humberto acompanha o olhar dela. Donato e Liza estão parados na porta.

MARIA ALICE: - Eu não posso acreditar que isso esteja acontecendo. (a Donato) O que você quer aqui?! Achei que já tínhamos conversado o suficiente lá no cemitério!

HUMBERTO: - Você falou com esse sujeito no cemitério? E agora ele está aqui? Quem é esse homem, mamãe?

LIZA: - Vamos embora, pai. A gente não é bem quisto aqui.

DONATO: - Agora que eu estou aqui, Liza, eu não vou mais embora.

BARRETO: - Vamos, Stefany, eu vou te levar pro salão de beleza.

STEFANY: - Nem morta, pai! Agora que vai começar o barraco na família Queiroz? Quero presenciar esse momento histórico.

NUNO: - Que fofoqueira!

STEFANY: - Para, garoto! Posta aí na rede social, maior climão aqui!

TARSILA: - Não posta nada, Nuno! Comportem-se!

HUMBERTO (a Maria Alice): - Quem é esse sujeito, mamãe?

DONATO: - Se ela a Alice não vai falar, pode deixar que eu mesmo me apresento. Para você, Humberto, e para todos os outros que não me conhecem, eu me chamo Donato.

HUMBERTO: - De onde você sabe o meu nome?

DONATO: - É simples. Eu sou irmão do Gurgel.

HUMBERTO: - Irmão do meu pai?! Eu nunca soube da sua existência... (a Maria Alice) Isso é verdade mãe?

MARIA ALICE: - É sim, meu filho.

DONATO: - Só tem um erro nessa sua colocação. Eu falei que era irmão do Gurgel e não do seu pai.

HUMBERTO: - Não há erro nenhum na minha colocação. O senhor é que está equivocado, agindo de forma inconveniente neste momento de pesar na minha família.

DONATO: - Nossa família, Humberto. E quando eu falo que havia um erro na sua colocação, eu falo com propriedade. Como eu disse antes, eu sou irmão do Gurgel e não irmão do seu pai. Seria impossível eu ser irmão de mim mesmo.

Humberto ri, debochado, irônico. Donato o encara. Humberto olha para Maria Alice, que chora, de cabeça baixa. Aos poucos, Humberto percebe o clima. Vai fechando o sorriso.

HUMBERTO: - Que brincadeira foi essa?

DONATO: - Não tem brincadeira nenhuma, Humberto. O que tem aqui é uma tremenda farsa isso sim.

MARIA ALICE: - Já chega, Donato! Vai embora!

HUMBERTO: - Do que você está falando?! Mãe, você sabe de alguma coisa? Alguém pode me explicar o que está acontecendo aqui?

LIZA: - Pai, vamos embora!

DONATO: - Para, Liza! Deixa eu terminar de contar a verdadeira história do seu irmão.

HUMBERTO: - Irmão?

DONATO: - Eu sou o seu pai, Humberto. Seu verdadeiro pai. Você não é filho do Gurgel. Sua vida, sua família. É tudo uma mentira.

Maria Alice cai, ajoelhada, chora. Tarsila se aproxima, ajuda a amiga. Humberto permanece parado no centro da sala, encarando Donato, sério, incrédulo.

HUMBERTO: - Que droga de brincadeira é essa?

DONATO: - Eu não vim de longe até aqui para ficar brincando com uma coisa séria dessas, Humberto. E me surpreende muito você não saber das suas verdadeiras raízes.

HUMBERTO: - Fala alguma coisa, mãe! O que esse sujeito aí está dizendo é verdade?!

Maria Alice olha para Humberto, olhos marejados. Ela desvia o olhar, baixa a cabeça e chora.

HUMBERTO: - Não... Isso não pode ser verdade. Isso não é verdade!

DONATO: - Eu sou o seu pai, Humberto. O sangue que corre em suas veias, é meu!

Humberto encara Donato.

CENA 08. ATELIER JAQUELINE. INT. DIA.

Jaqueline conversa com Daniel, sentados no sofá do atelier.

DANIEL: - A Bárbara?! Aqui?

JAQUELINE: - Eu até me surpreendi quando a vi entrando, toda arrogante, aqui dentro do atelier.

DANIEL: - E o que ela veio fazer aqui, meu Deus?

JAQUELINE: - Me ameaçar, oras!... Daniel, essa mulher é louca por você. E pelo o que ela me disse, é capaz de loucuras por você.

DANIEL: - Louca ela é mesmo.

JAQUELINE: - Vocês tiveram um caso, não?

DANIEL: - Coisa de juventude. Faz tempo isso. Só que ela ficou no pé.

JAQUELINE: - Pra ela, vocês ainda têm alguma coisa. Um amor que só ela vê... Tudo por causa da nossa foto.

DANIEL: - A foto da festa?

JAQUELINE: - Já está em quase todos os sites de celebridades.

DANIEL: - Nossa! Eu juro que ainda não me caiu a ficha de você ser famosa!

JAQUELINE: - Não sou famosa! (risos) Sou bem conhecida aqui na sociedade... mas não compartilho desse mundo de celebridades não.

DANIEL: - E acho que é isso também que mais me encanta em você. Essa sua humildade, simplicidade. Mesmo com todo dinheiro que você tem.

JAQUELINE: - Acho que nisso nós somos parecidos.

DANIEL: - Mas eu não sou rico.

JAQUELINE: - Mas é humilde, simples, e tem um coração enorme. Tão grande que guarda o meu aí dentro dele.

(sobe trilha “Sunday Morning” – Maroon 5) Os dois trocam olhares, se aproximam e se beijam, apaixonados, no sofá.

CENA 09. CASA QUEIROZ. SALA DE ESTAR. INT. DIA.

(fade out trilha “Sunday Morning” – Maroon 5) Donato e Humberto se encaram. Clima tenso.

HUMBERTO: - Quem é você para falar de sangue? Eu nem o conheço!

DONATO: - Não seja por isso! Eu me apresento novamente. Você nem pensava em nascer, não estava nos planos de ninguém. Nem da Alice, que na época não podia ter filhos. O Gurgel desde cedo foi empreendedor, já administrando um pequeno comércio de grãos aqui em São Paulo. E eu trabalhava com ele, responsável pelo transporte destes grãos... O Gurgel já estava namorando a Alice. Mas nunca escondeu a sua paixão pela (pausa)

MARIA ALICE: - Não ouse em falar o nome desta desalmada aqui dentro da minha casa!

TARSILA: - Calma Maria Alice!

MARIA ALICE: - Esse homem voltou pra destruir a minha vida! Ele já tinha acabo com a dele mesmo e agora quer levar a minha vida, minha família para o buraco!

DONATO: - Eu não acabei com a minha vida! Quem me ferrou foi meu próprio irmão... Ele morria de inveja de mim porque eu namorei a moça que ele sempre foi apaixonado.

MARIA ALICE: - Aquela bandida.

DONATO: - Eu acabei me envolvendo nuns trambiques no porto de Santos, quase fui preso. Seu pai, pra me livrar e principalmente livrar a cara dele de um escândalo que poderia pôr em risco o crescimento comercial dele, me deu um grana e me mandou embora, para nunca mais voltar.

HUMBERTO: - E onde eu entro nessa maldita história?

MARIA ALICE: - A tal mulher que o Donato namorava, ficou grávida. Ela era um dançarina num cabaré.

DONATO (ri, debochado): - Dançarina é ótimo, Alice...

MARIA ALICE: - Sem poder criar a criança, te deixou na porta da nossa casa, meu filho.

Humberto se choca.

HUMBERTO: - Eu sou filho desse sujeito aí com uma prostituta é isso?!

DONATO: - A grosso modo, é isso sim... E essa moça linda aqui (abraçando Liza) é sua irmã, Liza.

HUMBERTO: - E eu lá quero saber de irmã? De pai biológico? Eu quero saber como fica minha vida agora?! (encara Maria Alice) Me responde mãe! Como fica?! A empresa, tudo isso aqui... Eu não fico com nada? Meu pai não me deixou nada?

DONATO: - Seu pai sou eu, caramba! E eu não morri e nem tenho nada mesmo pra te deixar quando eu for desta pra melhor.

MARIA ALICE: - Você merece o inferno, Donato! O inferno!

HUMBERTO: - Vocês mentiram pra mim durante todos esses anos!... Por isso que o meu pai me odiava tanto!

MARIA ALICE (chora): - Ele não odiava você, Humberto...

HUMBERTO: - Claro que sim! Ele nunca escondeu a preferência pelo Henrique. Ele sabia que eu não era filho dele, por isso ele nunca me amou. Só amou o Henrique...

MARIA ALICE: - Quando eu finalmente consegui engravidar, você ainda era bebê, Humberto. E seu pai prometeu pra mim, amar você como se fosse sangue do mesmo sangue. Ele prometeu.

HUMBERTO: - Mas não cumpriu. Bando de mentirosos!

BARRETO: - Humberto, não diga isso! Seu pai sempre fez tudo por você e por seu irmão, na mesma medida.

HUMBERTO: - Vocês não sabem o que falam... Vocês não sabem!

Humberto sai descontrolado de casa. Maria Alice tenta ir atrás dele, mas é contida por Tarsila.

TARSILA: - Calma, Maria Alice! Não vai sair descontrolada assim!

MARIA ALICE: - Eu preciso ir atrás do meu filho!

DONATO: - Ele não é seu filho, Alice. Chega de ficar dizendo isso.

MARIA ALICE: - Era você quem deveria ter saído daqui! Donato, você voltou para acabar de vez com a minha família! Você nunca suportou o sucesso do Gurgel.

DONATO: - O Gurgel que nunca suportou o fato de eu ter tido um filho com a mulher que foi a grande paixão dele. E você sabe disso, Alice. Ele nunca amou você como a (pausa)

LIZA: - Vamos embora, pai. Você já causou muitos problemas aqui. Já chega!

MARIA ALICE: - Enfim uma voz sábia!... Essa garota nem parece sua filha. Ouça os conselhos da menina e vá embora, Donato. Para sempre! Você já causou muitos problemas.

DONATO: - Eu voltei para ficar, Alice. A gente ainda vai se encontrar por aí...

Donato vai saindo da casa.

LIZA: - Desculpa por tudo, dona Maria Alice. Eu juro que não sabia disso...

MARIA ALICE: - Tenho pena de você menina. Não merece esse pai.

Liza baixa o olhar e vai embora. Tarsila senta-se com Maria Alice no sofá. Barreto se aproxima delas.

STEFANY: - Gente, que horror! Imagina, você crescer, viver achando que é filho de uma pessoa e de repente, descobre que é tudo mentira?

NUNO: - Parece até filme.

BARRETO: - Procure se acalmar, Maria Alice.

MARIA ALICE: - Eu preciso falar com o Humberto. Ele não vai me perdoar nunca!

TARSILA: - Ele vai voltar, não se preocupa...

MARIA ALICE: - Que tragédia!... O Henrique está voltando pra casa e vai ficar horrorizado com tudo isso.

CENA 10. CENTRO COMUNITÁRIO. INT. DIA.

Salete recebe Ulisses no centro comunitário. Crianças brincam pelo local, outras praticam esportes.

SALETE: - Aqui a gente trabalha com crianças de várias idades e de todas as classes. É um grande centro de convivência. É bom para as crianças conhecerem as diferenças entre elas e respeitarem umas as outras.

ULISSES: - Confesso que sempre ouvia o Robson falar sobre isso aqui, mas eu não acreditava que era tudo isso não. É muito grande e muito bem cuidado...

SALETE: - Mas dá um trabalho danado! (risos) A gente sobrevive basicamente de doações. Um grupo de empresas mantém os nossos salários, meu e de mais algumas funcionárias. O restante, a pintura, a manutenção elétrica, hidráulica, jardinagem, cozinha, tudo é voluntário.

ULISSES: - Pode ter certeza que eu vou ajudar. Mesmo com Otávio estando aqui ou não.

SALETE: - Seu filho vai gostar. Você disse que ele é bem agitado, enérgico...

ULISSES: - Até demais! Mas às vezes ele se concentra bastante, para desenvolver aquilo que ele gosta. Vídeo game é a paixão dele, ele sabe tudo! Só que chega na escola, nas aulas de ciências, por exemplo, ele fica disperso.

SALETE: - Sei...

ULISSES: - A professora disse que ele se entedia fácil e tem temperamento às vezes agressivo com colegas quando é contrariado. É difícil aceitar isso, porque na minha frente, meu filho sempre foi um anjo! Não posso acreditar que ele esteja fazendo média comigo e nas minhas costas pintando minha caveira!

SALETE: - Calma, Ulisses, não precisa se precipitar... Agora com o Otávio vindo pra cá, eu vou poder acompanhar ele mais de perto para saber como ajudar no desenvolvimento dele. A criança ainda está moldando sua personalidade. É preciso ter paciência.

Neste instante, Fernanda se aproxima de Salete, sem perceber que o homem com quem ela conversa é Ulisses.

FERNANDA: - Salete, o pessoal que vai montar as barraquinhas da festa de São João vão chegar amanhã. Ligaram agora lá para o escritório.

Ulisses se mostra surpreso de rever Fernanda.

SALETE: - Que ótimo, Fernanda!

FERNANDA: - Mandaram novas fotos do projeto. Se quiser, está lá na sua mesa.

SALETE: - Eu vou ver sim. Ulisses, fique à vontade.

ULISSES: - Claro.

Salete sai. Fernanda percebe Ulisses olhando para ela.

ULISSES: - Então você se chama Fernanda...

FERNANDA: - Sim... E você, Ulisses.

ULISSES: - Que coincidência incrível. Eu pensei que nunca mais fosse te ver depois daquela festa. Então você trabalha aqui?

FERNANDA: - Sim, sou auxiliar da Salete na coordenação.

ULISSES: - Nossa, que bacana! Parabéns. É um lugar incrível isso aqui.

FERNANDA: – Obrigada.

ULISSES: - Meu filho vai adorar isso aqui...

FERNANDA: - Ah, você é casado?

ULISSES: - Eu? Não! (risos) Separado.

FERNANDA: - Ah ta... (risos)

ULISSES: - E você?

FERNANDA: - Solteira.

ULISSES: - Por opção?

FERNANDA: - Necessidade.

ULISSES: - Como assim?

FERNANDA: - É uma longa história... (risos)

ULISSES: - Posso te convidar para um café? Aí você me fala essa sua longa história e tantas outras que tiver. Estou inteiramente interessado em saber sobre você.

(sobe trilha “Além da Nova Ordem” – Julio Serrano) Os dois trocam olhares.

FERNANDA: - Claro.

ULISSES (pega um cartão no bolso): - Este aqui é o meu cartão. (entrega para Fernanda)

Fernanda pega o cartão de Ulisses, tira do bolso da camisa uma caneta e escreve seu telefone no verso do cartão, devolvendo-o para Ulisses.

FERNANDA: - E esse é o meu número. Me liga.

Fernanda sorri, sedutora, e se afasta. Ulisses pega o cartão, sorrindo bobo. (fade in trilha “Além da Nova Ordem” – Julio serrano) 

CENA 11. RESTAURANTE GOURMET PAULISTA. COZINHA. INT. DIA.

(fade out trilha “Além da Nova Ordem” – Julio serrano) Claude conversa com Monique na cozinha do restaurante. 

MONIQUE: - Eu confesso que fiquei preocupada com a Lenara. Ela deveria ter ido dar queixa na polícia. Não é normal alguém ser atacada assim e não fazer nada.

CLAUDE: - Vai ver ela não quis ficar se expondo assim. Agora já passou também. Ela está lá, a Jaqueline levou o troféu pra ela, tudo certo.

MONIQUE: - E a Raquel, hein? Que saudade dela!

CLAUDE: - Ainda nem me ligou... Ela fala com as meninas, mas não fala comigo! Mas deixa! Quando ela voltar, vou fazer trabalhar feito louca! (risos)

MONIQUE: - Coitada! Ela já deve estar estudando feito louca lá em Portugal!

CLAUDE: - E aproveitando também não é? Sabe que eu sinto que fiz a escolha certa, dando esse curso de presente pra Raquel? Ela é tão esforçada, tão determinada. Tenho certeza que está se dando super bem por lá.

CENA 12. APTO LENARA. ESCRITÓRIO. INT. DIA.

Lenara conversa com Raquel, por telefone. (cena alternada entre as duas)

LENARA: - Me conta tudo! Conheceu um gajo aí em Portugal, é isso?!

RAQUEL: - Sim, conheci, Lenara! (risos)

LENARA: - Para tudo, Raquel! Que maravilha! Eu disse pra você que essa viagem seria incrível! Agora me fala, como ele é? Sotaque, jeito... Bom de cama?

RAQUEL: - Ele é tudo de bom, amiga! Só que ele não é daqui de Portugal não. É brasileiro.

LENARA: - Ah não, amiga! Sair daqui do Brasil pra se engraçar com outro brasileiro no exterior não dá! Se bem que brasileiro é praga! Tá em tudo quanto é canto do mundo...

RAQUEL: - Então você não acredita na coincidência maior... ele é de São Paulo!

LENARA: - Ah não Raquel! Você está se superando hein amiga! (risos) Mas fala aí, quando o nome deste gato?

Neste instante, Otávio entra no escritório, brincando com seu game portátil, fazendo barulho. Lenara acaba não escutando o telefone.

LENARA: - Ai amiga, não ouvi nada!

RAQUEL: - Eu vou ter que desligar, preciso voltar pra aula!

LENARA: - Ai que pena! Eu sei que você está aproveitando tudo aí, mas eu quero saber quando você volta, Raquel?

RAQUEL: - Eu estou morrendo de saudades de todo mundo aí, mas eu só volto no final do curso né? Tem mais um tempo aqui ainda.

Otávio faz mais barulho com o game, Lenara o encara, irritada.

LENARA: - Amiga, agora eu vou ter que desligar. Beijo grande! Se cuida, Raquel!

Lenara desliga o telefone. Otávio brinca com o game, nem percebe Lenara se aproximando. Ela puxa o game das mãos de Otávio, joga no chão e pisa em cima, furiosa, quebrando o brinquedo.

OTÁVIO: - O meu brinquedo, mãe! O vídeo game que meu pai me deu!

LENARA: - Isso é pra você aprender a deixar de ser inconveniente! Eu estava falando no telefone, Otávio! E você com essa droga de vídeo game me atrapalhou!

OTÁVIO: - Esse vídeo game era novo!

LENARA: - Não me interessa! Agora sai daqui e me deixa trabalhar, vai pentelhar em outro lugar.

Otávio vai saindo, quando Lenara o puxa pelo braço, fica cara a cara com ele.

LENARA: - E o seu pai vai ficar muito chateado em saber que o seu querido vídeo game quebrou, ok?

OTÁVIO: - Você quebrou.

LENARA (firme): - Você quebrou! Você deixou cair no chão porque é desastrado, não sabe cuidar direito das suas coisas... Está me entendendo?

OTÁVIO: - Sim.

LENARA: - Ótimo. Agora pode ir. E não me enche mais o saco!

Otávio sai correndo do escritório.

LENARA: - Praga... Ai, pra relaxar acho que vou jantar no Gourmet Paulista. Só comida refinada pra levantar meu ânimo...

CENA 13. HOTEL. QUARTO. INT. DIA.

Liza e Donato conversam no quarto de um hotel.

LIZA: - Você não deveria ter feito aquilo, pai.

DONATO (deitando na cama): - Você acha é? (desdém) Que bom...

LIZA: - Eu estou falando sério! Você arrasou com a vida daquelas pessoas. A Maria Alice, o Humberto...

DONATO: - Aquela gente cresceu bem de vida enquanto eu tive que ficar enfiado num buraco lá no fim do mundo, Liza! Eu só quis trazer um pouco de realidade pra eles. A vida não é um mar de rosas não. E você sabe muito bem!

LIZA: - Mas era preciso tudo isso? Você poderia ter falado com eles de outra forma, num outro momento. Hoje foi o enterro do seu irmão!

DONATO: - Grande coisa. Ele nunca deu bola pra mim.

LIZA: - Criou o seu filho. Já é uma grande consideração.

DONATO: - Mas nunca amou o Humberto.

LIZA: - E você? Você ama o Humberto? Por que essa volta pra São Paulo, atrás deles todos? Não é só amor não, pai. Pode me falar!

DONATO: - Liza, fica quieta! Agora eu quero descansar! Faz o mesmo! Você vai se sentir bem melhor.

Donato vira pro lado na cama e dorme. Liza vai até a janela do quarto, olha a cidade de São Paulo, fica pensativa.

CENA 14. TRANSIÇÃO DO TEMPO

(sobe trilha “Turtango Instrumental”) Imagens de são Paulo ao anoitecer. Mostra a cidade iluminada, o movimento nas rodovias, as luzes dos prédios.

CENA 15. CEMITÉRIO. INT. NOITE.

(fade out trilha “Turtango Instrumental”) Humberto caminha pelo cemitério até chegar ao túmulo de Gurgel. Humberto encara a foto de Gurgel na lápide.

HUMBERTO: - Nem depois de morto você deixa de me dar desgosto. Velho imundo!... Então você não me tinha como filho querido justamente por eu não ser seu filho. Por um orgulho maldito, é isso?! Canalha! Você é um desalmado, amoral, monstro! (chora, raiva) Monstro, é isso que você é! Que culpa eu tenho de não ser seu filho? Eu fiz tudo o que você quis para poder ter o seu amor, a sua aprovação. Mas não! Jamais! Nem que eu fosse o Super Homem eu teria a bênção do todo poderoso Gurgel Queiroz!

Humberto caminha de um lado a outro. Para, volta a encarar a foto de Gurgel.

HUMBERTO: - Já o Henrique, nem se fosse um marginal, com certeza teria todo o seu amor e compaixão. Claro! Ele é o sangue do seu sangue, o legítimo! Sabia que eu rezo todos os dias para que esse sangue que corre nas veias de vocês apodreça? E eu tenho esperança de que, mais cedo ou mais tarde, o seu filhinho querido vai mostrar a verdadeira face. Ninguém é bom a vida inteira, Gurgel. Você não foi! Deu dinheiro para o irmão ir para longe só para não manchar a sua imagem de bom empreendedor!... Sempre o dinheiro, sempre o poder! E a mim, nada disso?! Nem depois de morto, seu velho imundo? Eu fiz muito bem em te deixar morrer mesmo, agonizando naquele estacionamento. Você me fez de tapete à vida toda e na hora em que precisa pede a minha ajuda? Mas foi é tarde! E eu não me arrependo... Não me arrependo de nada!... Eu só me arrependo é de não ter te enfrentado antes, desgraçado!

Humberto sobe no túmulo de Gurgel e sapateia, com raiva, pisoteando o túmulo.

HUMBERTO: - Vai para o inferno! Desgraçado! Você arruinou a minha vida! Não tenho direito a nada! Nem empresa, nem um tostão! E o trabalho que eu fiz do seu lado na empresa? Nada valeu? Velho idiota! A morte foi pouco pra você!

Humberto pisoteia com raiva o túmulo de Gurgel e só para quando percebe a presença de Henrique, incrédulo diante da cena. Os dois se encaram.

HENRIQUE: - O que você pensa que está fazendo sobre o túmulo do meu pai?!

HUMBERTO: - Encha bem a boca. Pode encher! Enche bem a boca para falar “meu pai!”. Realmente, ele é todo seu!

Humberto desce do túmulo.

HENRIQUE: - Você não tem respeito, Humberto? Que cena horrenda é essa que eu presenciei agora? Você estava pisoteando o túmulo, é isso?

HUMBERTO: - Estava extravasando a minha raiva!

HENRIQUE: - Você não está bem. Isso não é coisa de gente normal.

HUMBERTO: - Realmente eu não estou bem, Henrique... Pode ficar aí, chorando suas lágrimas para este cara aí. Talvez as suas ele mereça, porque as minhas ele não terá mais. Nunca mais! 

Humberto vai saindo. Henrique fica a olhar a foto de Gurgel na lápide do túmulo. 

HENRIQUE: - Pai... Eu saí do aeroporto direto pra cá, para te dar meu adeus. Mas diante do que eu vi, isso não pode ficar assim.

Henrique sai atrás de Humberto.

CENA 16. AVENIDA PAULISTA. CARRO HUMBERTO. INT / CARRO HENRIQUE. INT / EXT. NOITE.

Humberto dirige. Olhar tenso.

HUMBERTO: - Mas que droga! (olha no retrovisor) Henrique, vai chorar em casa! Me deixa em paz!

Em seu carro, Henrique segue Humberto.

HENRIQUE: - Você precisa me explicar o que aconteceu, Humberto. O que você fez é inadmissível!

Humberto acelera o carro e passa no sinal que está ficando vermelho, enquanto Henrique não consegue passar. Neste instante, Lenara vai atravessando a avenida quando Henrique tenta frear o carro para não atropelar Lenara, que nem percebe o veículo se aproximando.


novela de
Édy Dutra
 
elenco
Juliana Alves como Raquel
Guilherme Winter como Henrique
Christine Fernandes como Lenara
Júlio Rocha como Humberto
 
Daniele Suzuki como Jaqueline
Jonathan Haagensen como Daniel
Cláudio Lins como Ulisses
Rodrigo Hilbert como Robson
Cinara Leal como Bárbara
Carlos Casagrande como Claude
Diego Cristo como Joaquim
 
Erika Januza como Aimée
Liliana Castro como Fernanda
Léo Rosa como Marcelo
Aline Dias como Stefany
Cecília Dassi como Carol
Luiz Otávio Fernandes como Nuno
Renata Castro Barbosa como Salete
Bernardo Mesquita como Cássio
Jonatas Faro como Igor
Odilon Wagner como Carlos
 
Rodrigo dos Santos como Barreto
Patrícia Werneck como Monique
Karina Bacchi como Keylla Mara
Nando Cunha como Candinho
Sérgio Guindane como Leopardo
Letícia Colin como Rita
Luiz Felipe Mello como Otávio
Maria Pinna como Lisa
 
atrizes convidadas
Carolina Ferraz como Paula
Regina Braga como Maria Alice
Aída Leiner como Tarsíla
Tânia Alves como Zuleica
Zezé Motta como Rosa

atores convidados
Zé Carlos Machado como Donato
Aílton Graça como Macedão
Nuno Leal Maia como Jair
Jean Pierre Noher como Santiago
 
Malu Galli como Dalva
Sônia Braga como Vilma
Reginaldo Faria como Gurgel
 
trilha sonora
Sunday Morning – Maroon 5
Além da Nova Ordem – Julio Serrano
Turtango Instrumental
 
produção
 Bruno Olsen
 Diogo de Castro
 Israel Lima
        

Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.



REALIZAÇÃO



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