Funerária Dois Irmãos: Capítulo 07 - WebTV - Compartilhar leitura está em nosso DNA

O que Procura?

HOT 3!

Funerária Dois Irmãos: Capítulo 07

Novela de Marcelo Caronesi
Compartilhe:




FUNERÁRIA DOIS IRMÃOS - CAPÍTULO 07




 

            Odílio e Odilon caminham pela rua da casa onde moram. O dia está indo embora, dando lugar à noite. Pessoas acenam para eles; mulheres nos portões e homens sentados nas calçadas. Logo que chegam até a porta da casa param. Odílio abre a fechadura e ambos entram no imóvel.

         Lá dentro, Odílio acende a luz e aponta para o sofá. A sala já está toda mobiliada. Além do sofá, uma grande poltrona, uma mesa de centro, uma estante, quadros nas paredes. É uma casa bastante arrumada para dois homens; ainda mais quando são dois bandidos se passando por irmãos. Pessoas de fora poderiam até dizer que Odilon tinha mania de organização e limpeza. Odilon obedece a indicação de Odílio. Ele puxa uma cadeira e senta-se de frente a Odilon.

         – E então? – pergunta Odílio.

         – Então o que? – responde Odilon.

         – Nós temos um problemão, não?

         – Qual? – questiona Odilon.

         – Às vezes eu acho que você se faz de idiota; mas às vezes eu quase tenho a certeza de que você é um idiota de verdade, sem precisar fazer esforço.

         – Odílio, eu já tô ficando de irritado de você ficar encrencando toda hora. Fala qual é o problema que nós temos? – reage Odilon.

         – Faz quanto tempo que a nossa casa funerária  funcionando?

         Odilon conta nos dedos.

         – Quatro meses? É isso?

         – Sim. São quatro meses – diz Odílio, balançando positivamente a cabeça. Quantos enterros a gente fez?

         – Sete?

         – E você não acha isso um problema? Sete enterros em quatro meses? Você acha que dá pra sobreviver com isso? – questiona Odílio.

         – Talvez.

         – Eu vou tentar ter paciência e ser educado com você, já que você se ofende com tudo. Mas eu quero que você seja sincero: teve algum motivo pra você ter escolhido São Pedro e não Pirassununga ou outra cidade qualquer? – indaga Odílio.

         – Puta que pariu! Lá vem você de novo com esse assunto. O que cê acha que eu ia ganhar com isso? A gente já falou disso uma porção de vezes.  acha que eu ia fazer alguma coisa pra perder dinheiro?

         Começando a se irritar, Odílio pede:

         – Vamos lá. Refresque a minha memória.

         – O combinado foi uma cidade pequena, mas não tão pequena. Distante de São Paulo e de outras cidades grandes; eu escolhi uma cidade longe de tudo, mas isso você não reconhece. Tinha que ser uma cidade que tivesse falecimentos com uma certa frequência. São Pedro tem onze mil habitantes, teve enterros nos dias que eu fiquei, e pronto. Tava dentro do padrão que a gente estabeleceu. Se nós tamo tendo azar agora, daqui a pouco a maré muda, e o negócio melhora – explica Odilon.

         Uma gritaria de mulheres e crianças começa na rua, chamando a atenção de ambos. Odilon se assusta.

         – O que é isso?

         Odílio levanta-se rapidamente e, correndo em direção à porta da rua, diz para Odilon:

         – Vamos! Pode ser que alguém tenha morrido!

         Odilon e Odílio veem a alguns metros de sua casa um grupo de pessoas no meio da rua: sete mulheres, doze crianças e dois homens. Eles chegam até o grupo, questionando o que havia acontecido. Uma mulher rechonchuda, bastante nervosa, passando as mãos pelos cabelos, explica:

         – Ai, meu Deus do céu! Foi a onça-parda, seu Odílio. Ai, meu Deus! Eu ouvi as galinha fazeno muito baruio no quintal. Meu Deus do céu! Quando eu vi foi aquele bichão correndo!

         – Mas atacou alguém? Alguém se feriu? Alguém morreu? – indaga Odílio.

         – Não. Graças a Deus, não. Só matou uma galinha memo.

         – E ela foi pra onde? – questiona Odilon.

         Uma criança que está com a mão pegada na da mulher, responde:

         – Correu lá por trás de casa, no quintal. Ela deu um pulão pelo muro, e fugiu pra mata.

         Uma mulher baixinha, com um pano na cabeça e bastante irritada, se dirige a Odílio.

         – Faz tempo que a gente fala co delegado Ferreira, mas ele não faz nada. É até perigoso andar tarde da noite na rua. Até o seu Irineu reclama, mas ninguém faz nada.

         Ela se vira para Odilon.

         – Viu, seu Odilon. Tá perigoso ocêis andar de noite na rua. Eu sei que cêis gostam de tomar umas pinguinhas lá no Pereira, mas é bom evitar. E ainda mais ocêseu Odilon, que costuma andar sozinho por aí tarde da noite.

         A barulheira de vozes continua e, discretamente, Odílio puxa Odilon um pouco distante da multidão.

         – Que história é essa de andar por aí sozinho tarde da noite? – indaga Odílio.

         – Ué, quando eu  com insônia, eu saio pra caminhar, ora. E  não sai sozinho também?

         – Pro Pereira, ou lá pra algum outro bar. Mas sair pra andar?

         Odilon aproxima a sua boca próximo ao ouvido de Odílio.

         – A gente tem que agir como gente normal. Fazer amizade com o pessoal. Às vezes eu vou na casa de algum amigo, jogo baralho até um pouquinho mais tarde. Eu já tenho umas amizades, rapaz – explica Odilon.  te faltando ter mais proximidade e ser cordial com as pessoas.

         A mulher rechonchuda que quase fora atacada pela suçuarana se aproxima dos dois e, escandalosamente, anuncia.

         – Olha lá. Lá vem o delegado Ferreira. Vamo ver o que ele vai dizer dessa vez.

         Ferreira é um homem magricelo e de bigode fino. Ele caminha lentamente, fumando um cigarro, acompanhado por uma pequena multidão de crianças, mulheres e homens, que falam sem parar. O grupo que vem com ele se junta ao grupo que já estava na rua. Ferreira faz questão de apertar as mãos de Odílio e de Odilon, como se ambos fossem pessoas muito importante. Ele tosse, e então fala:

         – Vamos lá. Como foi que aconteceu?

         A vizinha rechonchuda repete a história exatamente como narrara para os irmãos.  

         – Mas se foi só uma galinha, pra que tanto barulho, minha gente?

         Forma-se um alvoroço de revolta em torno do delegado. “Podia ter sido uma criança”, diz uma mulher. “O doutor ainda acha pouco?”, resmunga um homem. Odílio presta atenção na bagunça e não percebe quando Odilon saiu de perto dele. Ao se dar conta que ele não estava mais ao seu lado, começa a passar a vista por todos os lugares, buscando por Odilon. Olha para a casa, pra conferir se há alguma luz acesa; mas lá está tudo escuro. Enfim, Odílio consegue encontrar Odilon. Distante, ele conversa com uma mulher; uma jovem muito bonita, pele clara, cabelos castanhos, de seus vinte e poucos anos. Ela usa um vestido florido. Odílio presta atenção no que as pessoas conversam com o delegado Ferreira, mas mantendo, os olhos em Odilon e na moça.

         – Então, vamos fazer o seguinte: a partir de hoje, depois das sete horas, todas as crianças de São Pedro da Cachoeira vão se recolher pra dentro de casa. Os adultos que se sentirem ameaçados também se recolhem e  tudo resolvido. E ponto final.

         Uma nova gritaria de protestos começa contra o delegado, que sai caminhando pelo mesmo caminho por onde viera. As pessoas o acompanham, reclamando. Outras pessoas continuam na rua, também reclamando entre si. Odilon continua a conversar com a jovem. Odílio permanece parado, ignorando completamente as pessoas que reclamam com ele sobre a decisão do delegado. Odílio não ouve os gritos ensurdecedores no seu ouvido; ele está prestando atenção em Odilon e na mulher, que nunca tinha visto antes. Passados alguns segundos, Odílio se vira e caminha em direção à sua casa; algumas mulheres o acompanham, ainda reclamando do que Ferreira havia decidido. Na porta de sua casa, uma mulher questiona:

         – Mas  num acha que o delegado Ferreira tá errado, seu Odílio?

         Odílio abre a fechadura, olha para a mulher e diz, secamente:

         – Boa noite, dona Neves.

         E fecha a porta na cara delas.

escrita por
Marcelo Caronesi

elenco
Odilon
Odílio
Tereza
delegado Ferreira
Onça-parda

tema
Canções de Assassinato 

intérprete
Confraria da Costa

direção
Carlos Mota

produção
Bruno Olsen
Cristina Ravela

Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.


REALIZAÇÃO


Copyright © 2022 - WebTV
www.redewtv.com
Todos os direitos reservados
Proibida a cópia ou a reprodução



Compartilhe:

Capítulos de Funerária Dois Irmãos

Funerária Dois Irmãos

No Ar

Novela

Comentários:

0 comentários: