QUANDO ANA OLHOU PARA A DIREITA - CAPÍTULO 09
No dia seguinte, Ana se preparava para ir até a festa no Guarujá, e sabia que precisava arrasar no visual. Há muito tempo, não se dedicava tanto em preparativos para uma balada. Cabelo e maquiagem impecáveis, era hora de escolher a roupa perfeita. Revirando o guarda-roupas para encontrar o vestido ideal, Ana acabou encontrando um belo vestido preto, que havia ganhado de presente da irmã mais nova em seu aniversário, mas sequer havia estreado. A ocasião merecia uma peça nova.
Ana experimentou aquele lindo vestido curto de paetê,
sustentado apenas por duas alças finas em seus ombros e com um caimento
perfeito. Um decote que mostrava seus seios um pouco mais que o de costume eram
um atrativo aos olhos. Ana calçou uma sandália preta que combinava
perfeitamente com o vestido, e, ao se olhar no espelho, balançou levemente seu
corpo, como se fizesse um pequeno movimento de dança. Suficiente para ela
pensar: “Você vai arrasar, detetive. Você está maravilhosa!” Jogou o cabelo
de lado, colocou seu calibre .38 de cano curto dentro da pequena bolsa que
compunha o look e partiu em direção ao Guarujá. Nem mesmo uma hora de estrada
estragaria toda sua beleza naquela noite.
Ana chegou ao local indicado por volta das nove da noite,
a festa já estava a todo vapor. Antes de entrar, ela trocou mensagens com o Cabo
Drummond para confirmar a operação, ele informou que a batida aconteceria por
volta de 22h30. Era uma linda casa à beira-mar, moderna e aparentemente com
muitas pessoas afortunadas, pois o estacionamento parecia mais uma
concessionária de carros de luxo.
Ao entrar na festa, sozinha, Ana se sentiu incomodada por
alguns instantes, mas não por estar sozinha, e sim por ter atraído tantos
olhares. Ela precisava tomar uma bebida para se acalmar. Afinal, ela estava
sozinha em uma operação muito importante. Então caminhou direto em direção ao
bar montado à beira de uma grande piscina iluminada com luzes de neon azul, e
pediu uma marguerita ao barman, que lhe atendeu imediatamente.
Ana se sentou ao lado do balcão para apreciar seu drinque
observando todos os movimentos dos convidados que passavam por ali. Enquanto
descartava prontamente alguns flertes, notava que a festa estava cheia de
lindas mulheres. Em sua maioria, jovens entre 20 e 25 anos, e muitos homens
acima dos 40 anos, provavelmente donos dos Porshes e Mercedes do
estacionamento. Não era um ambiente em que Ana ficava à vontade, mas precisava
encarnar seu personagem e se aproximar do anfitrião antes da operação entrar em
ação.
Caminhou observando os vários pontos da casa e percebeu
muitas jovens se drogando pelos cantos do interior da residência. Precisava
resistir ao instinto policial e não sair de seu disfarce naquele momento. Próximo
ao horário da operação, Ana procurou Felipe pela casa e ao encontrá-lo se
manteve por perto até que ele a notasse.
— Que bom que você veio! — Cumprimentou-lhe com um beijo
no rosto. — Você está incrível! Quem sabe, podemos ficar juntinhos essa noite —
disse ele, colocando um feixe de cabelo de Ana atrás de sua orelha.
Ana trocou alguns xavecos com o suspeito, impedindo que
ele se distanciasse dela por muito tempo. Durante a conversa com Ana, Felipe
escutou algumas pessoas correndo e dizendo que a polícia estava entrando na
festa. Enquanto homens de cabelo grisalho tentavam se desvencilhar das jovens e
sair pelos cantos da casa, Felipe abandonou a conversa com Ana em direção a uma
fuga pela porta dos fundos, mas ela o puxou pelo braço com seu revólver
apontado diretamente para seu rosto.
— Você está preso, Felipe Moreira Alcântara! Ajoelhe-se e
ponha suas mãos na cabeça! — ordenou a detetive enquanto aguardava o Cabo
Drummond se aproximar para efetuar a prisão.
Ao perceber que havia sido enganado pelo charme de Ana, desistiu
de qualquer reação e obedeceu à ordem, ajoelhando-se na frente da detetive. A expressão
de decepção no rosto de Felipe valeu todo o esforço de Ana em ter que se
arrumar e encarnar aquele personagem que não tinha nada a ver com ela.
A operação tinha intuito de apenas levar Felipe detido
para que Ana pudesse investigar. Entretanto, a quantidade drogas encontrada na
festa era suficiente para mantê-lo por um bom tempo na cadeia, mas isso tudo
dependeria da colaboração do suspeito.
Sem perder tempo, ao chegar na delegacia, Ana pediu
autorização para que pudesse interrogar o suspeito sozinha, pois as informações
que ela precisava eram confidenciais de um caso importante. Foi atendida e logo
levaram Felipe para a sala de interrogatório e avisaram a Ana que ela já poderia
entrar e ficar à vontade.
— Ora, ora! Se não é a policial sedutora?! — disse Felipe
ironicamente quando Ana entrou na sala.
— Detetive Torosídis pra você... Morfeu! — respondeu Ana,
ironizando o apelido do suspeito. — Você não disse que gostaria de passar a
noite comigo? Estou realizando seu desejo.
— Prefiro envolver meu advogado nessa noite com você.
— Ou... você pode aceitar o acordo que vou fazer e sair
daqui hoje mesmo, sem nenhuma queixa sobre essa noite.
— Não tenho nada a dizer!
— Sei que sua família tem dinheiro, mas te garanto que as
acusações iriam te assegurar pelo menos alguns dias na cadeia — informou Ana. —
Talvez queira usar seu charme em uma cela com quinze outros ‘galanteadores’ — finalizou
ela, fazendo o sinal de aspas com os dedos.
— Então vou ouvir sua proposta, detetive!
Ana arrastou uma cadeira vazia e se posicionou em frente
ao suspeito algemado do outro lado da mesa, calmamente abriu sua pasta e começou
a retirar alguns documentos. Aquela tranquilidade de Ana estava deixando Felipe
extremamente ansioso, já que ele não fazia ideia qual era o acordo, até que Ana
começou a falar.
— Quero que você me conte tudo sobre a quadrilha do
tráfico de pessoas!
— Co... como assim? Do que você está falando?
Ana
havia impresso uma folha com vários crimes em que Felipe poderia ser acusado
apenas por aquela batida policial na festa. A cada negativa que ele dava, ela
marcava um X na frente da possível acusação para que ele visse que sua
colaboração seria sua única salvação.
— Ok! Perturbação da ordem pública — respondeu Ana,
marcando um X no primeiro item da lista. — Temos provas e denúncias que você
faz parte de uma grande quadrilha que trafica pessoas para o exterior — acusou
Ana.
— Não, não. Isso é mentira!
— Certo! Tráfico de drogas. — Marcando mais um item.
— O que é isso? Você não pode me acusar dessas coisas — disse
Felipe em tom arrogante, mas era possível notar o medo em seu rosto a
quilômetros de distância.
— Claro que posso! Exploração sexual — respondeu Ana, marcando mais um item.
— Tudo bem, tudo bem! Eu aceito seu acordo. — Felipe
relutou por algum tempo, mas sabia que a detetive estava falando muito sério.
Mesmo pagando fiança, aquele processo poderia colocá-lo na cadeia por muitos
anos.
— Eu quero
imunidade total! Quero que a polícia não faça mais batidas na minha casa — exigiu
Felipe.
— Acabou? Não quer também um dia no SPA? — debochou Ana. —
Desconsidere minha oferta. Acabo de desfazer nosso acordo — finalizou ela,
juntando alguns papéis na mesa.
— Espera! Eu quero acordo, mas quero alguma coisa em
troca. Quero imunidade nesse caso.
— Vai depender da participação nos crimes, e, claro, sua
colaboração com a gente.
— Olha, é sério! — argumentou Felipe. — Eu não sei quem
comanda ou como funciona, eu só faço alguns transportes às vezes.
— Informação insuficiente para o acordo — disse Ana se
levantando.
— Estou falando sério. Eu apenas uso a lancha para levar
algumas garotas ao Rio de Janeiro ou para Santos. Elas são trazidas por um
cara, não sei o nome dele. Ele chega, tira as meninas meio dopadas da
caminhonete, a gente as coloca na lancha e leva até o destino. Lá, tem outro
cara esperando com o dinheiro — confessou Felipe sua participação, tentando se
justificar.
— Quem é esse cara? Como são essas meninas? Que tipo de
caminhonete? — disse Ana, tentando tirar o máximo de informações enquanto
Felipe estava nervoso pela confissão inicial.
— Não sei o nome dele. Ele só chega, entrega e vai
embora. Quase nunca fala. Mas é um cara forte, com mais ou menos 1,90 de
altura, cabeça raspada e um cavanhaque apenas na parte do queixo.
Ana continuou pressionando.
— E as
meninas? Qual a idade delas? Qual foi a última vez que você fez o serviço?
— Nem sempre dá pra ver direito. Algumas chegam
encapuçadas ou amordaçadas. Mas, na maioria das vezes, são bem novinhas, entre
15 e 20 anos. Tem mais de um mês que esse cara não aparece com nenhuma
encomenda.
Felipe tentou se esquivar de algumas perguntas. Antes de
falar, tentou se lembrar de informações que não iriam comprometê-lo tanto.
Ana bateu na mesa, e, com um tom bem acusativo, disse:
— Quero
mais coisas, Felipe!
— Não tenho mais coisas! As meninas caem em promessas de
trabalho como modelo no exterior, ou às vezes prometem que elas irão trabalhar
em cruzeiros por um tempo, algumas aparentemente vêm de família pobres. Aí fica
fácil — respondeu ele, assustado.
— E a tal caminhonete? Como ela é?
— É uma Hilux preta, como qualquer outra! Com placa de
São Paul... Espera! — Felipe fez uma pausa, como se buscasse na memória uma
informação relevante. — Na época, pensei que poderia ser útil, mas não imaginei
que seria minha passagem de saída dessa sala — finalizou ele com uma expressão
de quem tinha uma ótima carta na manga. — Tenho o número da placa dele! — disse
ele se recostando contra a cadeira, como se houvesse vencido uma discussão.
A vontade de Ana com a reação de Felipe era de quebrar os
dentes daquele sorriso convencido, mas preferiu respirar fundo e aceitar a
oferta do número da placa.
— Onde está esse número? Na sua casa, eu suponho.
— Isso! Mas preciso ser um homem livre para ir buscá-lo —
disse ele com certa ironia.
— Tudo bem, eu dirijo — concordou Ana. — Se tentar alguma
coisa, não tenho problema nenhum em deixar esse rostinho bem machucado — finalizou
ela, apoiada sobre a mesa com o dedo apontado para Felipe.
Ana providenciou a liberação do suspeito e disse que as
acusações seriam retiradas só depois que a informação sobre a placa fosse
checada por ela. Felipe concordou e seguiu escoltado pela detetive até sua
casa, onde encontraram os restos da festa e algumas pessoas. Mesmo sem a
presença do dono, dormiam espalhadas pela casa.
— A empregada vai ter muito trabalho amanhã! — comentou
Felipe ao andar pela residência.
— Sem papo furado! — retrucou Ana com um leve empurrão em
suas costas. — Pegue logo o número da placa e vamos terminar isso.
— Certo, certo! Está no meu cofre, lá no quarto.
Os dois subiram até o segundo andar da casa para
encontrarem a tal anotação. Ana, com arma sempre empunhada, pronta para
qualquer ação repentina do suspeito, não precisou usá-la. Felipe realmente
queria apenas ficar livre das acusações e seguir sua vida normalmente, sem a
detetive por perto.
— Toma! É esse número aí — disse Felipe, mostrando o
número de uma placa anotado no canto de uma folha da agenda. — Anotei na
primeira vez que ele veio aqui.
Ana precisou confirmar aquele número e ligou para sua
delegacia, falando com um policial de plantão daquela noite. Após conferir, informaram-lhe
que a placa GKZ-0707 era de uma Toyota Hilux SW4 3.0 na cor preta com cabine
dupla, que estava vinculada ao nome de Petros Guerra de Castro.
Ana
confirmou que a placa batia com descrição de Felipe, e o melhor de tudo, poderia
também ser a caminhonete investigada no caso das jovens mortas.
— Confirmei
a placa e bate com a sua descrição — disse Ana, desligando e telefone e
caminhando em direção à porta. — Vou ligar para a PM e as queixas serão
retiradas. As queixas dessa noite. O resto da sua vida é problema seu.
— Combinado,
detetive. Tenha uma boa viagem! — respondeu ele, rindo. — Espero não vê-la
nunca mais.
— Torça
pra isso! Se eu precisar voltar, não teremos mais acordos — ameaçou Ana. — Outra
coisa, tente não sumir, você seria suspeito de delatar a quadrilha. E se esse
cara aparecer novamente, me ligue imediatamente.
Mesmo
fazendo Felipe acreditar que estava livre, Ana pretendia intimá-lo como testemunha
do caso assim que prendesse o suspeito da caminhonete. Ela virou as costas para
Felipe e desceu as escadas, acordando duas jovens que dormiam no sofá, dizendo
para irem pra casa. Entrou em seu carro, ligou para o policial Drummond,
agradeceu pela grande ajuda e disse que deu certo. Ela conseguiu a informação
que precisava para seu caso e estava voltando para São Paulo.
Encerra com a música: (Confident - Demi Lovato).
elenco
Larissa Manoela como Helena Torosídis
Cristina Ravela
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