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Quando Ana Olhou para a Direita: Capítulo 11

Minissérie de João Paulo Coca
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CAPÍTULO 11


QUANDO ANA OLHOU PARA A DIREITA
 

A combinação entre o cansaço, a decepção e o relaxante ‘receitado’ pela amiga fez com que Ana dormisse profundamente por algumas horas. Ela despertou por volta das 18h, tomou um demorado e relaxante banho quente antes de pedir seu jantar. Após se vestir confortavelmente para passar todo o fim de semana em casa, Ana abriu seu aplicativo do iFood e começou a deslizar o dedo pelos cardápios. Sem comer praticamente o dia todo, ela estava faminta. Escolheu um prato de filé à parmegiana acompanhado de uma porção extra de batatas fritas e arroz, de um restaurante próximo à sua casa. Incluiu também em seu pedido uma bela sobremesa, uma torta de Nutella com leite ninho.

Enquanto aguardava seu pedido ser entregue, Ana mandou uma mensagem para Letícia agradecendo os cuidados. Obrigada por me trazer pra casa, Lê! Acordei agora e estou um pouco melhor. Depois colocou água e comida para Perseu, que rolou pelo tapete da sala se divertindo com seu osso de plástico.

Letícia respondeu à mensagem de Ana se colocando à disposição da amiga caso precisasse de companhia no fim de semana. Se precisar de mais alguma coisa, se quiser sair, quiser companhia, é só falar, que corro pra sua casa.

Mesmo não planejando nenhuma aventura no fim de semana, Ana agradeceu e não dispensou completamente a oferta de companhia da amiga. Mas, de acordo com seus planos, ela passaria o fim de semana dormindo, comendo e maratonando uma série de comédia, já que ela precisava se divertir um pouco, mas sem sair do sofá.

Ela iniciou seu planejamento de fim de semana assim que seu jantar foi entregue. Acomodou-se no sofá enquanto selecionava a série Friends na TV para apreciar seu filé à parmegiana e batata frita, que estava especialmente crocante e saborosa naquela noite. Mesmo que o jantar tivesse sido suficiente, Ana ansiava por aquela sobremesa, e, claro, devorou dois pedaços enormes daquela torta deliciosa. Após algumas horas alternando entre algumas séries de comédia, Ana acabou pegando no sono novamente, ali mesmo, em seu sofá.

Na manhã seguinte, acordou logo quando o dia amanheceu com Perseu caminhando sobre suas pernas, e percebeu que dormiu no sofá. Mesmo ainda chateada, Ana acordou mais disposta naquele sábado e resolveu correr, mas aproveitou o dia de folga para fazer uma caminhada ao ar livre. Vestiu seu traje de sua calça de caminhada e um moletom confortável, colocou uma coleira em Perseu e caminharam por dez minutos até o Vale do Anhagabaú, utilizando o calçadão do local. Por quase uma hora, ela alternou pequenas corridas e caminhadas, apenas com a companhia do Bulldog, que não era muito resistente a exercícios.

Enquanto caminhava, Ana passou por centenas de pessoas, que, mesmo no sábado, estressavam-se em filas de congestionamento, apertavam-se em ônibus cheios e corriam atrás de uma vida melhor. Tentava se distrair com pensamentos aleatórios, mas o rosto das jovens que ela viu jogadas naquele banheiro abandoado a assombrava a todo momento. Infelizmente, seria uma imagem difícil de ser apagada da memória, mas ela sabia que precisava se distrair ao máximo pra isso.

Ao terminar seu trajeto, parou em uma pequena barraca de tapioca para tomar um café-da-manhã. Pediu um suco de laranja e um pouco de água para Perseu, que estava exausto. Enquanto tomava seu suco e aguardava sua tapioca ser preparada, notou uma família se divertindo próximo a ela. A irmã maior ajudava a mais nova a se equilibrar em cima da bicicleta, enquanto a mãe observava com os olhos brilhando.

Aquela cena fez Ana se lembrar de como a vida era simples na infância e como a vida adulta era cruel com a sociedade. Ao caminhar de volta pra casa, Ana ligou para a irmã, a doce Helena.

— Oi, irmãzinha! Lembra de mim? — brincou Ana.

— Oi, Ana. O que aconteceu? — respondeu Helena, meio sonolenta. — Está tudo bem?

— Está, sim, meu bem! Só queria falar com você.

— Nossa, Ana! Quase infartei com esse telefone tocando — disse, aliviada — Você é muito desconectada mesmo! Quem ainda liga para as pessoas? ­— finalizou ela, soltando uma gargalhada.

— Tá me chamando de velha? Porque acho que estou mesmo.  

— Que isso, irmã! Você está maravilhosa. Mesmo tendo me acordado, eu ainda te amo.

— Quais seus planos para o fim de semana?

— Não tenho aula hoje, então fiquei na dúvida se devo ficar aqui em Campinas e estudar ou se vou em casa ver a mamãe.

— Então venha! Pensei em levarmos a mamãe para um passeio, no zoológico, talvez. Ela adorava, lembra?

— Ótimo! Vou me arrumar, que ainda pego o ônibus antes do almoço — respondeu Helena, bem empolgada.

— Que maravilha, vou avisar à mamãe que você está vindo. Até mais tarde!

Após finalizar a ligação com a irmã, Ana voltou pra casa antes de ligar para sua mãe, pois Perseu já estava ansioso pelo retorno. Pode ser difícil acreditar, mas quando Perseu notou que chegaram ao prédio em que moravam, ele olhou para Ana como se estivesse sorrindo, aliviado pelo fim da maratona. Enquanto Ana tomava banho, seu companheiro bebia mais água e se aconchegava no tapete felpudo do lado de fora de sua cama, seu local preferido.

Ana trocou mensagens com e Helena e confirmou que a irmã viria para a cidade e chegaria por volta de meio-dia à rodoviária. Ana disse que iria esperá-la no saguão de desembarque do Terminal Rodoviário do Tietê. Então telefonou para sua mãe e a convidou para uma tarde no zoológico com as duas filhas. Vera aceitou prontamente o convite!

Por volta de meio-dia, Ana já aguardava Helena próximo ao portão de desembarque do terminal. Sentou-se em uma das cadeiras de espera e se distraiu por cerca de uns 15 minutos, vagando pelas redes sociais, algo que normalmente não faria. Pesquisou também sobre as novidades do zoológico de São Paulo e se havia opções para almoço no local. Decidiu que seria melhor almoçarem lá para aproveitarem melhor a tarde.

Helena desembarcou e logo avistou Ana sentada à direita da área de espera. Ao se aproximar, Ana logo abraçou a irmã caçula, que não via já há quase um mês.

— Só uma mochila? — perguntou Ana. — Você sempre levava duas malas se fosse dormir na casa de uma amiga — finalizou, sorrindo.

— Sou adulta agora, Ana! — disse Helena, colocando a mão na cintura. — E outra, já vou treinando para meu intercâmbio daqui uns anos.

— E aonde pensa que vai?

— Papai conseguiu um contato pra mim com um amigo na WWF. Assim que me formar, bye bye! — disse ela, fazendo um sinal de despedida. — Vou ficar alguns meses na África e Ásia salvando alguns animais da extinção.

— Geeente! Que ótimo, Helena! Sabia que um dia você ajudaria salvar o mundo — respondeu Ana, pegando a mochila da irmã e colocando em seu ombro. — Vamos! A mamãe está esperando. Vamos passar em casa para pegá-la, deixar suas coisas e almoçar no zoológico.

— Mas será que tem alguma opção...

— Vegetariana? Tem sim, já olhei isso pra você — interrompeu Ana.

— Ótimo! Porque estou morrendo de fome.

No caminho até a casa da mãe, as duas conversaram muito sobre os planos de Helena para o futuro, mas Ana evitou falar do próprio trabalho, pois não queria sequer lembrar do dia anterior.

— O Hélio não quis vir? — perguntou Ana sobre o irmão gêmeo de Helena, que também estudava em Campinas e dividia o apartamento com a irmã.

— O Hélio? Prefere ficar no campus, onde ele faz o maior sucesso! — contou Helena. — Lá, o Hélio da Medicina é disputadíssimo.

— Moças ou rapazes? ­— perguntou Ana com um tom desconfiado.

— Os dois! — respondeu Helena aos risos. — Mas, por favor, fica entre a gente! Se o papai souber, você pode imaginar...

— Diz ele que não tem preconceitos, mas imagino o sermão que daria — disse Ana, fazendo uma careta. — Para um homem que trouxe pra casa quatro filhos fora do casamento, ele é muito conservador dos bons costumes da família.

— Verdade! ­Pelo menos, você é adotada! — respondeu Helena, encarando a irmã com um sorriso irônico.

— Não é a primeira vez que ouço isso esse mês! — disse Ana, gargalhando. — Chegamos — falou enquanto estacionava o carro. — Corre lá, deixa suas coisas, troca de roupa, vai ao banheiro, mas não demore!

— Tá bom... mãe! — respondeu Helena, brincando com a irmã mais velha.

Helena saltou do carro quase em movimento, correu para dentro de casa, como sugeriu a irmã e cumprimentou rapidamente a mãe, que já as esperava no jardim frontal da residência.

— Oi, Ana! ­— disse Vera, estendendo os braços, aguardando um abraço.

— Oi, mamãe. Como a senhora está hoje?

— Estou ótima, filha! Quando ligou me falando do passeio, fiquei eufórica. Pergunte à Dagmar! — disse ela, apontando para a empregada, que estava parada na porta, já com a bolsa da patroa.

— Realmente, há muito tempo, não a via tão feliz ­— concordou Dagmar.

— Alguma orientação, Dagmar? — perguntou Ana em voz baixa se aproximando da empregada.

— Ela toma dois remédios 4 da tarde, estão na bolsa.

— Sem problemas, vou colocar um alarme no telefone! — garantiu Ana, pegando a bolsa da mãe. — Heleeena! — gritou ela, tombando a cabeça para o lado de dentro da porta.

A irmã caçula desceu correndo as escadas, respondendo Ana.

— Tô indo! Precisava ir ao banheiro. — Ela passou pela porta, envolveu seu braço ao de sua mãe e caminharam em direção ao carro.

As três partiram em direção ao zoológico para curtirem uma tarde entre as mulheres Torosídis, algo que não acontecia desde que Helena era criança e Ana adolescente. Chegaram ao zoológico e foram direto para o restaurante almoçar, uma comida leve para não atrapalhar a caminhada. Antes de começarem o passeio, compraram um sorvete expresso na entrada do local.

A futura veterinária Helena estava ansiosa para entrar no parque e começar a ver os animais, o que fez sua mãe lembrar de quando elas ainda eram crianças.

— A Helena sempre foi apaixonada por animais, principalmente os selvagens — comentou Vera enquanto caminhavam em direção à entrada.

— Lembra quando viemos aqui e ela queria abraçar o urso? — disse Ana, aos risos. — Ela chorou tanto, que tivemos que comprar uma pelúcia gigante pra ela abraçar.

— Claro! Aquele urso ainda está no quarto dela até hoje — respondeu Vera

Enquanto passeavam pelo parque, as três riam e se divertiam como não faziam a muito tempo. Helena tinha acabado de passar pelo período de provas na faculdade e precisava relaxar. Vera se sentia novamente como uma mãe, esquecendo completamente sua depressão e revivendo aqueles momentos divertidos com as filhas. Ana conseguiu esquecer por algumas horas dos seus problemas no trabalho e soube aproveitar cada minuto com a mãe e a irmã.

Quando terminaram o tour pelo zoológico, elas estavam com expressões de felicidade raras de se ver entre membros da família. Brincavam e faziam piadas entre si, sobre os irmãos, e, claro, sobre o patriarca Konstantinos, que era mais motivo de reclamações que piadas.

Tiraram muitas fotos dos animais e delas mesmas, divertiram-se muito tentando algumas fotos mais ousadas e que não saíram como esperado. Aquela tarde foi maravilhosa, era tudo que Ana precisava para se reestabilizar emocionalmente.

O passeio durou cerca de duas horas, mas pareceu um dia inteiro de diversão. Enquanto entravam no carro para irem embora, Vera perguntou se não podiam fazer uma pausa no caminho de volta pra casa.

— Ainda não são cinco horas, o que acha de fazermos uma visitinha surpresa à Zoé?

— Seria ótimo. Tem muito tempo que não vejo a titia — respondeu Helena

— Claro, o que você quiser fazer! — disse Ana, acariciando o ombro da mãe.

O orfanato da tia ficava no caminho de volta para a casa dos pais, e Ana também achou que seria ótimo incluir a quarta mulher da família Torosídis naquele dia tão especial. A Tia Zoé iria adorar recebê-las, ela normalmente se dedicava apenas ao trabalho e raramente era visitada por uma comitiva de familiares.

 

Ao chegar no bairro, Ana confirmou com a mãe o local do orfanato, pois já havia muito tempo que ela não passava pela região.

— Vire naquela próxima rua — disse Vera, apontando com o dedo.

Quando Ana olhou para a direita, logo se lembrou do local. Enquanto estacionava o carro do outro lado da rua do orfanato Arquiem, Ana viu um homem saindo da sala da tia, que ficava na frente do imóvel. O homem caminhou até seu veículo e saiu rapidamente. Ana firmou seus olhos para tentar identificá-lo e ficou totalmente paralisada.

O veículo não era o mesmo, mas era ele, Petros.

Aquela visão do seu principal algoz nos últimos dias, saindo do orfanato, deixou Ana completamente desorientada. Enquanto sua mãe e irmã desciam do carro, a detetive reativava o seu caso na cabeça como uma máquina de decodificação tentando encontrar dados que fizessem sentido para aquele homem estar saindo do orfanato da tia.

— Ana! Ana! — Escutou seu nome sendo chamado pela mãe, o que fez ela voltar a si.

— Você não vem? — perguntou Vera, já de fora do carro.

— Claro, estou indo. Um segundo!

Ana desceu do carro, ainda meio atônita com a situação, e atravessou a rua junto com a mãe. Helena já estava do outro lado, indo abraçar a tia, que saiu de sua sala e já caminhava em direção à família.

A detetive sabia que não poderia questionar a tia naquele momento sobre o que seu principal suspeito estaria fazendo ali, então tentou agir naturalmente durante a visita ao orfanato.

Após alguns minutos de visita, Ana começou a insistir que não poderia demorar muito tempo ali, que precisaria ir embora o quanto antes, pois ela ainda tinha um compromisso naquele sábado à noite.

 A visita se tornou rápida, mas Ana continuava com a cabeça borbulhando enquanto dirigia de volta para a casa dos pais. Ao chegar, ela recusou o convite da mãe para entrar e disse que voltaria outro dia. Deixou a mãe e a irmã em casa, agradecendo pela tarde maravilhosa, e dirigiu direto para a delegacia. Seu compromisso naquela noite de sábado era investigar sua própria tia.

Encerra com a música: (Creep - Radiohead).


autor
João Paulo Coca

elenco
Giovanna Antonelli como Ana Torosídis
Sheron Menezzes como Letícia
Cauã Reymond como Felipe Morfeu
Otávio Muller como Antero Torosídis
Antônio Fagundes como Konstantinos
Alexandre Borges como Georgios
Miguel Falabella como Dimitri
Carmo Dalla Vecchia como Andreas Torosídis
Larissa Manoela como Helena Torosídis

trilha sonora
Creep - Radiohead

produção
Bruno Olsen
Cristina Ravela

Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.


REALIZAÇÃO


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