1x01 - A Lenda do Fantasma de Lucas da Feira
de Neila Reis
No
início dos anos 1800, na região de Feira de Santana, no interior da Bahia, um
escravo fugiu de
uma senzala, onde sofria maus tratos e entrou para a história. Seu nome era
Lucas Evangelista.
Lucas sempre foi um menino valente e até mesmo brigão. Não aceitava a injustiça e a opressão
que ele e os escravos sofriam,
por isso,
vivia apanhando ou sendo amarrado no tronco. O fazendeiro achava que fazendo
isso, conseguiria domar aquele espírito rebelde. Era
raro o dia que o jovem não apanhava e dormia com fome. Mas a alma de Lucas era
livre, vivia
buscando alcançar a sua liberdade, vivia tentando fugir e toda noite sonhava
que era livre e sabia voar.
Numa
noite de chuva e após apanhar muito mais uma vez, ele conseguiu se soltar e
correr pelo mato em meio a escuridão. Talvez pela forte chuva ou por achar que
a surra o tinha matado, demoraram para perceber a fuga, e enfim, Lucas foi em busca da sua sonhada liberdade. O dia já raiava quando
deram por sua falta, e dele, sem sombra ou pó.
Ao
fugir da senzala, se deparou com um problema: para onde ir…o que fazer... era
negro fugido, não tinha onde e como sustentar, se o achassem, o matariam (seria exemplo, para os outros não tentarem fugir
também). Ele jurou que não voltaria para aquela vida sofrida e que também
ajudaria outros a se libertar da escravidão.
Sem
muitas opções para sobreviver, resolveu se tornar bandoleiro e justiceiro. Ele não tinha medo
de briga e era bom na lida com armas e logo se tornou chefe de um bando. Logo
ganhou fama, pois roubava dos mais ricos, se recusava a roubar os pobres e,
muitas vezes distribuía dinheiro entre os necessitados.
Muitos
achavam que Lucas era o Robin Hood do Nordeste brasileiro, sendo adorado e
protegido pela população, embora fosse considerado um grande bandido pelos
fazendeiros. Dizem que mesmo sendo um
bandido temido, ele era bom e meigo com as crianças, dava comida aos idosos e
não deixava as
mulheres apanharem. Se algum membro do
bando machucasse uma mulher ou criança,
era expulso.
Lucas
também não permitia maus-tratos
contra negros, mulheres e crianças, contam que já amarrou um fazendeiro no
tronco e lhe deu
umas lapadas no lombo, para ele sentir na pele a dor que causava. Ele também
ajudou em muitas fugas de senzalas da região. Era tão grande a sua fama, que
passou a ser chamado de Lucas da Feira, o rei da região.
O
povo cantava os feitos de Lucas, e em cada esquina alguém contava
seus feitos :
“Lucas
é valente, brigou com mais
de 100, deixou todo mundo não e saiu rindo...” .
“...um
homem quis botar seu escravo para puxar a carroça, Lucas botou foi ele nos arreios e fez o
chicote estalar”...
“Isso não é nada… Lucas fez chover dinheiro em uma vila, onde o povo estava
com fome e o coronel deitava em uma cama de ouro..”
Lucas
virou o inimigo número um dos fazendeiros e ricos da região, que exigiram a sua
cabeça e o fim daquela ousadia. Agora, muitos queriam ser como Lucas, e esse
exemplo tinha que acabar.
Em
uma emboscada, alguns de seus companheiros foram presos e após serem
torturados, um deles delatou o esconderijo do bando. Vários policiais cercaram
o local, houve troca de tiros, e mesmo ferido, Lucas conseguiu escapar.
O
povo comemorou, era um grande feito de valentia de Lucas, mas as autoridades
não poderiam aceitar essa humilhação. Após dias de caçada, ele
foi enfim preso e condenado à morte.
No
dia 25 de setembro de 1849, Lucas da Feira foi enforcado em praça pública em
Feira de Santana. Os mais velhos falam, que na hora que ele morreu, uma chuva
muito forte caiu na cidade, e os ventos fizeram todos os sinos das igrejas
badalarem. Embora
muitos digam que Lucas era mal e bandido, muitos outros o defendem, pois ele
teve que se adaptar a sua dura realidade para poder sobreviver, para estes,
Lucas é herói.
Alguns
anos depois da sua morte, em uma fazenda no interior, um negro estava sendo
espancado por um fazendeiro, ele tinha tentado fugir e foi pego. Ele estava
sangrando e muito machucado, sentia que iria morrer de tanto apanhar, na hora
que iria receber o golpe que daria fim a sua vida, uma sombra segurou a mão do fazendeiro no ar, era
o fantasma de Lucas da Feira que surgia para defender todo negro inocente.
Em
uma rua escura e já tarde da noite, uma mulher volta para casa com uma panela
bem grande na cabeça. Nesta noite, ela demorou para vender todo o seu mingau,
estava cansada e feliz pois iria poder comprar enfim, um chinelo para o caçula
estudar. Passara meses juntando o dinheiro. A escola não deixava entrar descalço e o sonho
dela era fazer do filho um doutor. Distraída no sonho, não percebeu alguém se
aproximando por trás, quando deu por si, alguém colocara uma faca em suas costas e
lhe pede o dinheiro. Ela chora e implora desesperada. ‘valei-me Lucas, tenha misericórdia de mim..’ mas antes de terminar
a frase, o ladrão gira no ar e voa para trás, como se fosse tomado por uma mão invisível. Antes
de correr em disparada, a mulher vê o fantasma de Lucas da Feira
pairando no ar na
frente do ladrão..
A
cidade de Feira de Santana cresceu, mas volta e meia se ouve alguma história
onde o fantasma de Lucas aparece do nada para assustar algum malfeitor. Pelas
casas e ruas pobres e onde existir injustiça, o fantasma de Lucas da Feira aparece para salvar, basta gritar: “valei-me Lucas...”.
Se o coração for bom e a causa for nobre, o socorro virá.
Conto escrito por
CAL - Comissão de Autores Literários
Produção
Cristina Ravela
Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.
REALIZAÇÃO
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