Capítulo VI – 1350 (PESTE)
Ano de 1350. A peste negra
arrasava o vilarejo de Brownski. Assim como em outras regiões da Ásia e Europa,
milhares de pessoas sucumbiam como vítimas indefesas, deformadas por escuras
feridas pustulentas. Cadáveres eram atirados em valas comuns, e queimados por
homens amedrontados, usando estranhas máscaras em forma de bico de pássaro.
A fome implacavelmente
atingia os povoados, produzindo hordas de ladrões, em busca de cada vez mais
escassos alimentos.
Desesperados, os
camponeses buscavam refúgio em novas religiões, acreditando em pecado e castigo
divino, a explicar as terríveis provações pelas quais passavam. Um
número crescente de fiéis se convertia ao cristianismo, passando a rejeitar os
cultos pagãos e seus praticantes, em sua maioria do sexo feminino.
Mulheres independentes
e ligadas às práticas naturais foram perseguidas, aprisionadas, e acusadas de flertar
com o Diabo. Sob tortura, confessavam os mais odiosos pecados, desde o assassinato
e antropofagia de crianças, até orgias sexuais em cirandas sob o luar,
ornamentadas por fogueiras e adereços místicos.
Eram então
julgadas, condenadas, e queimadas vivas em agonia, oferecidas em perdão, como
para aplacar a ira divina e mitigar a peste.
Muitos relatos dos
momentos finais das infelizes levavam a conjurações, aterrorizando àqueles
presentes às atrocidades.
Daciana voltou
gradualmente à consciência. Sua cabeça ribombava em forma de dor. Filetes de
sangue escorriam sob suas narinas e punhos. Imagens violentas voltaram-lhe à
mente: de como havia sido arrancada de sua cama, puxada pelos cabelos e atirada
ao chão, sob socos e pontapés de covardes encapuzados, munidos de tochas
flamejantes.
Não entendia o motivo de
tanto ódio contra ela própria. Muitos de seus vizinhos de localidade haviam
perecido, tomados pelas chagas da peste. Suas ervas e poções ajudavam a
confortar e a minimizar a dor dos pobres moribundos, em seus momentos finais.
Ela mesmo aguardava o
momento no qual os miasmas a tocariam. Pelo menos sua mãe e avó descansavam e
não passariam por aquele tormento...
Ecos distorcidos de suas
lembranças surgiram: arrastada que foi até uma carroça com grades de madeira;
crucifixos postados contra seu rosto; xingamentos e pedradas havia recebido;
pessoas que conhecia e havia ajudado, ali estavam a vociferar contra ela;
silvos e zunidos; lembrou-se de ter perdido a consciência, ao ser rispidamente
atirada à cela, puxada por um par de equinos.
Com a visão e os sentidos retornando,
aos poucos discerniu que vestia uma túnica malcheirosa, por sobre o corpo
voluptuoso... percebeu no peito uma grande cruz em tom carmim, ainda com sinais
de que acabara de ser pintada. O pentagrama tatuado no ombro direito fora
arrancado, e o local ardia em carne viva.
Percebeu, finalmente,
estar acorrentada a um tronco de madeira, no interior de um porão fétido,
exalando urina de ratos. Os raios prateados da lua cheia insinuavam-se por uma
pequena abertura no alto do calabouço, trazendo gritos de ódio e aflição,
entremeados à fumaça e ao cheiro de carne queimada, ambos a logo inundar seus
sentidos...
Max Rocha
Elenco
Direção
Carlos Mota
Bruno Olsen
Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.
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