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Antologia Contos Contemporâneos da Violência Urbana: 5x02

Conto de Rosa do Deserto
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Sinopse: Um anel de brilhante torna-se o motivo de uma grande tragédia.



5x02 - O  Anjo e o Brilhante
de Rosa do Deserto


O nome era José Firmino, tão simplório. Era o anjo da guarda dos moradores.

– Zézinho, recebe minha encomenda, preciso sair.

– Leva minha filha na escola, estou com pressa para ir trabalhar hoje.

– Não esqueça de regar minhas plantas.

– Olha, lave bem as escadas.

Mas o brilhante fatídico nos fez órfãos do seu amor de pai frustrado pela natureza, nascera com um só testículo e sua opção sexual não era  relacionamento com mulher.

       Vou chamá-lo de fatídico o anel de brilhante porque a linda joóia veio predestinada a trazer a dor, a despeito de ser uma delicada joia adornada por um brilhante solitário encravado no ouro branco e que parecia uma estrelinha, anel que nem sequer cheguei a usar. E por que não usaria?

    Estava casada há pouco tempo e como trabalhava fora, não tinha tempo de cuidar da casa nem das crianças em tempo integral, portanto, contratei a serviçal. A moça ainda não tinha catorze anos de vida, mas larga experiência no trato dos homens, o que eu não tinha tanta apesar de ter mais de trinta anos.

Em atenção ao fato de ser pessoa trazida pela sogra, dei toda a assistência à família de Lucinda, inclusive despesas com a mãe que viera do interior, como se diz, uma mão atrás, outra na frente, literalmente. 

Muito pobres, paupérrimos, mas destruíram minhas ilusões do amor perfeito que esperava do casamento.

Justamente o corpo fala, e. sem uma palavra que fosse, num gestual de sedução, foi assim que Lucinda se insinuou e, com o poder de sua graça e juventude arrastou para si o meu marido, como uma serpente peçonhenta. 

A família deu apoio fazendo-a acreditar que tudo que era meu dela seria, caso conquistasse definitivamente o amor do meu marido.

Toda noite era um sofrimento quando eu chegava cansada do trabalho, queria curtir o marido, ver tv junto, conversar quando ele também chegara do trabalho, mas qual o quê... a moça saía do banho e não contente em ficar sacudindo os cabelos cacheados molhados, ainda fazia com a toalha uma corda que girava, girava sobre si, evidentemente para chamar sobre si as atenções daquele coitado. Fraco, se enrabichou pela adolescente.

   Comecei a perder as noites de sono. E se acontecesse alguma coisa entre ela e meu marido?  Eu me comprometera a cuidar da menor como filha, que pena!

   A garota frequentava as aulas com assiduidade e aproveitamento, era boa aluna. Tinha um bom coeficiente de inteligência. E por ser a mais alta da turma, espiava e colava tudo da melhor aluna da sala, uma menina baixinha, que sentava ao seu lado. Enfim, safada. 

Meu marido já não dormia direito, nem eu. Foi assim algum tempo, como se esperássemos que algo fosse acontecer. Eram o fim do doce lar e pior, o de uma pacata família.

      Uma noite, o inevitável aconteceu. 

O que houve? O vizinho, que era policial militar, já veio armado, pensando que fosse algum ladrão. E o que vê? A vizinha de camisola chorando muito e gritando por socorro, era roubo sim, mas de amor.  Fiquei desesperada porque flagrei o meu marido tentando entrar no quarto do quintal onde a serviçal dormia. Gritei, gritei e o vizinho veio me socorrer.

  O cínico disfarçou:

– Não foi nada, Seu Godofredo, escutei um barulho e vim ver se era algum ladrão no quintal e minha mulher começou a gritar.

O bom homem afastou-se e se foi desejando-nos boa noite. A noite se fez sim, mas no meu coração.

Nunca um policial exercera tão bem a defesa da sociedade ali representada, na sua célula mãe, a família. Não fosse ter um vizinho perfeito na hora certa, que desfecho teria aquela cena patética? 

Eu estava enfurecida e meu marido já havia tirado da gaveta um revólver. Mais tarde, tentou convencer toda a família que eu estava louca, imaginando coisas por ser ciumenta, mas enfim consegui, no dia seguinte, com muita persistência, devolver a mocinha aos seus. Ainda bem, cumpri bem meu papel de guardiã da donzela nem tão bela, nem tão donzela. 

      Cássio comprou o anel de brilhantes para negociar-me o perdão. Sabe-se que o perdão não se impõe, ele pode não ser aceito, agora ser negociado, como barganha material?  Para mim nunca. Eternizaria a lembrança de todo o mal que me fez.

Guardei a joia, pois no momento fiquei sem chão. Não esperava que aquele jovem, era mais jovem que eu, fosse capaz de tanta sordidez. Mentiu para a família com tanta segurança, me fez passar por ciumenta neurótica, maluca mesmo e ainda se deu por aborrecido porque não fui conivente com a patifaria que ele queria manter no lar. 

Guardei a joia no bolso de um paletó em desuso, no guarda-roupa   de casal, junto a outras menos valiosas. 

Veio a nova empregada, não quis seduzir o patrão, mas sim subtrair bens materiais, sorrateiramente. De vez em quando eu conferia as joias. E foi assim que descobri que faltava um rubizinho, uma ametista, provavelmente arrancado com um alicate de cortar cutículas.  

Agora sim enlouquecida, toda vez que via as joias porque lembrava da traição, decidi num ímpeto próprio, do qual mais tarde me arrependeria, jogar tudo no lixo. Só me traziam aborrecimento, daqui a pouco, vêm mais problemas, pensei. Fora com essas peças! E eu preciso da empregada, que é boa para minhas filhas. 

Embrulhei-as em papel fino e joguei-as na lixeira do prédio. 

O porteiro Firmino ao separar o lixo, deu com aquele embrulhinho em papel de seda e, ao abrir ficou surpreso. Quem teria jogado aquelas joias no lixo? 

Como tinha boa-fé e comentou com um conhecido que frequentava a sua humilde casa de porteiro e zelador: 

      – Veja, o que achei, essas joias na lixeira. 

O outro, sujeito malvado e ambicioso, a quem o ingênuo homem recebia em sua casa como amante, acreditou que ali houvesse uma pequena fortuna e, esperou o porteiro tirar o cochilo depois do almoço, para furtar-lhe as joias. Mas o pior aconteceu. 

Aquele a quem tínhamos como o grande protetor, sonolento, abriu os olhos e viu o ladrão colocando o pequeno pacote no bolso, acordara na hora errada, o outro, para não ser denunciado, voou sobre ele apertando-lhe o pescoço, até asfixiá-lo, matando-o. 

Logo ele, que sempre foi o nosso segurança na portaria contra os assaltantes, dormira com o inimigo, sem o saber.

Dentre em pouco ouvimos a correria e os gritos da síndica, que ao dar pela falta do porteiro na sua guarita, achou-o caído já sem vida. 

      – Mataram o Firmino!

Assim, a joia, que seria o inadmissível preço de um perdão, agregou ainda o injustificado preço de uma vida.

      Destino fatídico do anel de brilhantes, que se foi, deixando a dor nos moradores e as escadarias sem o brilho da limpeza perfeita que só o Firmino sabia fazer ao polir os degraus.

      O anel que tu me deste, não era vidro, mas me quebrou, melhor que eu o tivesse no vaso sanitário no mesmo dia em que recebi o preço da traição.




Conto escrito por
Rosa do Deserto

Imagem
Leni dos Santos Maia

CAL - Comissão de Autores Literários
Agnes Izumi Nagashima Gisela Peçanha Paulo Mendes Guerreiro Filho Pedro Panhoca Rossidê Rodrigues Machado Telma Marya

Produção
Bruno Olsen


Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.


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