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Antologia O Mal que nos Habita - 3x02

Conto de Gracioneide
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Sinopse: Felipe e sua avó vão visitar sua bisavó, que estava supostamente doente. Durante essa viagem descobrem um segredo e maldição na família que perdurou anos, o qual estava diretamente ligado à sua existência. 

3x02 - O Baú Velho da Bisa
de Gracioneide


Quando entrei de férias eu e minha família fomos viajar para o litoral. Viagem que fazemos todos os anos. A vovó Bernadete que morava com a gente após o falecimento do nosso avô tinha recebido uma carta da mãe dela, ou seja, minha bisavó. Só a vi por foto pois rumores diziam que a mesma tinha amaldiçoada minha vó. Apesar de não saber o que era bem maldição. Porém, a foto era tão ruim que acho que se a visse pessoalmente não conheceria. Ainda na praia ficava a olhar para aqueles escritos e de relance lembro bem da data: Boa Morada, 07 de julho, de 1995. A carta falava que ela estava doente e precisaria que alguém da família a fosse visitar. Ela parecia não querer muito ir a seu encontro. Mas algo lhe toca o coração:

— Eu vou! Não tem jeito. É minha mãe. Quer ir comigo, Carmem?

— Eu não! Leve um dos meninos. 

Quer dizer, minha mãe jogou a responsabilidade para um de nós e eu, Felipe, esse que vos fala, tive que ir. Por ser o mais velho e também o mais sensato entre os três varões da família.

Soube que o interior era longe e de difícil acesso.  Minha vó saiu dirigindo seu jipe por mais de 250 quilômetros da capital. No caminho ela expôs algumas informações de minha bisa; que ela era filha única, igualzinha também a minha vó Bernadete, que era filha única e igual minha mãe. Porém, essa corrente fora quebrada com o nascimento dos três netos.

— Vó, por que a senhora não tem muito contato com sua mãe? Perguntei.

— Porque eu tive que fugir para casar-me com seu falecido avô.

— A senhora era danadinha! Disse rindo

— Me respeita moleque!  Eram outros tempos. 

Não demorou muito tempo e chegamos. Aproximadamente às 5:30 da tarde. Era uma casa velha, construção antiga. De um lado, um lugar onde se tinham muitas ovelhas. Bonitas até. Batemos no portão e de lá sai uma senhora meio branca e de olhos verdes. Foi aí que percebi de quem eu herdei o verde dos meus olhos e um sinal no rosto, que mesmo enrugado, dava para perceber que era o mesmo que eu tinha.

— Quem é vivo sempre aparece! Disse ao abrir aquele grande portão para a gente.

— Eu soube que a senhora estava muito doente! Falou minha avó.

—  Essa gente não tem o que inventar! Disse a velhinha. 

Escurecera rápido e as luzes não eram tão fortes quanto as nossas. Eram incandescentes.

A casa tinha um corredor grande que dava acesso aos quartos. Percebi que a bisa tinha uma mesinha cheia de santos. Ela passou pela mesa, se benzeu e tomou uma espécie de xarope que melhorou sua voz. Fomos até a cozinha e nesse tempo eu não largava da mão de minha avó. Ao chegar à cozinha tudo era bonito, várias plantas, um ar agradável, panelas penduradas, era bonita a cozinha.

Ela nos ofereceu uma pamonha fresquinha.  Que por sinal, Era muito gostosa.

— Ó saudade dessa pamonha! Falava minha vó lambendo os dedos.

— Fiz porque sabia que viria.

Demoramos em torno de uma hora. Fomos para a varanda e depois para o quarto, ao qual iríamos repousar. O quarto pertencia a minha avó quando ela era criança. Dava para perceber ao olhar as bonecas que já eram envelhecidas. Eu pedi até para tirá-las da cômoda pois lembrava daqueles filmes de bonecos assassinos, estava realmente com medo de suas fisionomias. Enfim, fomos dormir. A cama, embora velha, era confortável; o clima estava bem agradável, mas por volta da meia noite escutei um choro de bebê. Achei que estivesse sonhando, porém voltei a escutar novamente. Era noite de sexta para sábado, só embrulhei-me dos pés à cabeça e nada disse. Não demorou muito e não ouvi mais o choro, conseguindo pegar no sono. Quando já íamos para a cozinha perguntei a minha avó.

— Vó, a senhora não ouviu nenhum barulho estranho ontem?

— Não, Felipe! 

—  Pois eu ouvi! Um choro de criança!

— Deixe de besteira menino. Não tem nem criança aqui. É só impressão sua.

Chegamos até a cozinha e antes do café a bisavó nos levou para olharmos sua horta. Era linda de se vê. Colhemos cebolinha, coentro, alface, algumas pimentas e pimentões.  Ao lado de uma cerca vi um pé de roseira branca. Até achei bonito, pois nunca tinha visto rosas grandes e daquela cor. Minha vó tirou uma e a pôs no cabelo. Terminado nosso passeio à horta fomos a cozinha tomar um café preto com um bolo de milho muito gostoso.

— Segunda vamos lhe levar mãe para a cidade fazer uns exames.

— Nem sei se estarei viva! Dizia ela.

— Deixe de coisa! Já vai começar. 

Percebi que a minha vó ficou um pouco apreensiva, mesmo sabendo que sua mãe estava bem-disposta, e não parecia tão doente assim.

Depois do delicioso almoço que a bisa preparou, fomos dormir na varanda. Sem muita coisa para fazer, estava lendo minhas revistinhas em quadrinhos.

Quando a noite chegou, ficamos a conversar um pouco, e novamente fomos para os nossos aposentos dormir. E quando dá meia noite, escuto novamente um choro de bebê.

Dessa vez acordei minha vó, pois fiquei com mais medo ainda.

— Vó, escuta! Um choro de criança.

Ela acordou meio atordoada e disse:

— Meu Deus! É mesmo um choro de criança.  Ela saiu, mesmo no escuro, e procurou o interruptor. Na hora em que ela ligou a claridade, veio sessando, assim, o choro. Observamos um brilho em cima de um guarda-roupa velho. Porém, olhamos melhor e tratava-se de um baú. Ficamos com medo, achando que tinha uma criança escondida naquele baú. 

Na manhã de domingo dissemos para a bisa que há duas noites que escutávamos choro de criança. Ela desconversou:

— Não era nada! Venham tomar café! Mas dava para perceber como ela estava tensa.

Tomamos café, almoçamos, só que ficamos inquietos com aquela situação. Na hora que fomos para os nossos aposentos, resolvemos tirar aquele baú velho do guarda-roupa.  Mas ele estava trancado. Tinha na frente as Iniciais F.H.P. Tentamos novamente abrir, só que o mesmo estava bem fechado. Fui caçar um clip para poder abrir. Quando já estava quase conseguindo ouço aquela voz:

— Não mexa ai!

Ficamos assustados. Porém, era minha bisa que chegou na hora e nos tomou o baú.

— Tem alguma criança escondida aí bisa?

— Claro que não, menino! Disse ela.

E por que não deixa a gente vê mãe? Disse minha avó, a interrogando.

O que está aqui não interessa a vocês! Minha bisa falava abraçada com o baú.

— Será bisa?  Eu não saio daqui enquanto esse baú não for aberto. Não vou mais dormir, assustado com choro de criança.

Como já não havia mais o que fazer, a mesma tira um colar de seu pescoço e abre o baú.

Ficamos apreensivos para saber o que tinha lá. Ela começou a tirar um monte de joias de ouro, tirou uma foto de quando era jovem, ao lado de um rapaz.

— Você reconhece esse homem? Perguntou para minha vó Bernadete.

— Me parece familiar, mas não sei!

— Esse é Felipe, seu sogro.

— Então esse é meu bisavô? Disse assustado e lembrando que tinha herdado o nome dele.

— Sim! Esse baú era dele, Felipe Horácio Pinheiro.

— Mas eu não entendo! Minha vó sacudia a cabeça. 

— Ele era casado com minha sogra, a Penélope.

Depois, sem nada mais a dizer, tirou um xale velho do baú enrolado com algo. Ao tirar o pano nos espantamos, pois tratava-se de um crânio de uma criança.

— Talvez isso aqui seja o motivo do choro ao qual vocês escutam. Ela olhava fixamente para ele.

  Ficamos parados, vendo aquela cena macabra. 

— Já que o baú foi descoberto, vou lhes contar a história. Só me escutem, e ao final tirem suas conclusões.

E a partir de agora começa a história da bisa Bernarda.

“Minha mãe trabalhava na casa de seu Horácio. Eu era uma menina de seus 15 anos. Meu pai falecera picado por uma cascavel, deixando minha mãe viúva comigo ainda pequena. Não tenho muita lembrança dele. Naquela época era tudo muito difícil.

Minha mãe trabalhava como cozinheira naquela enorme casa. Eu ajudava, passando a roupa com um ferro bem pesado, mal conseguia levantá-lo, pois era magrinha. O seu Horácio tinha um filho mais ou menos da mesma idade que a minha. Ele gostava de caçoar de mim, o nome do rapaz era Felipe, e não sei como começou, mas o certo foi que nós nos apaixonamos, porém eu era filha da cozinheira. Socialmente não tínhamos condições de se envolver. Tanto que minha mãe pedia o fim de tudo aquilo, todavia não atendi. Um dia me envolvi com ele em um canavial e acabei engravidando. Como a família dele era de posses, não queria herdeiros bastardos e tentaram fazer com que eu abortasse, mas eu resisti. Devido a muitas ameaças fugi com minha mãe para outra cidade. Essa aqui na qual moro atualmente. Assim que chegamos, procuramos uma casa para trabalhar e a fiquei ajudando até enquanto a criança não nascesse.

Ao nascer meu varão, ficamos nos duas no quartinho com ele.  Um menino bom, saudável, não nos dava trabalho. O seu sorriso me fazia esquecer a vida infeliz que tive com o pai do garoto, minha vida resumia-se aquela criaturinha. Tentei seguir minha vida sem ao menos lembrar da família paterna dele. 

Meu pequeno já tinha três anos quando deu uma grande febre; levei-o ao hospital e ele ficou lá até darem a medicação que parou toda aquela febre. por volta da meia noite estava voltando do hospital quando um homem misterioso me aborda. Percebo que o menino começa logo a chorar.

—  Seu filho, não é mesmo! Disse o homem misterioso.

Ao terminar de falar pressenti o perigo, e ainda tentei abraçar ele, mas já era tarde demais. Ele apenas o olha muito rápido e dá um tiro em seu peito. Sai apressadamente me deixando desesperada. Logo que ouviram o tiro, várias pessoas chegaram e tentaram socorrer, mas já era tarde demais.  

Passados os sete dias de luto. Fui a uma feiticeira para saber quem encomendou a morte daquele anjo, mesmo desconfiando que era coisa da família do pai. Ao saber da confirmação, ela ainda me ressaltou que foi devido a herança. Pois a avó dele havia feito fortuna, mas não se sabia ao certo se isso partira do próprio avô, do pai ou dos tios, pois eram famílias em que os filhos eram homens. 

Então, naquele momento, eu pedi a ela que fizesse um feitiço em que todos os descendentes homens daquela família teriam que morrer. Mas para que o feitiço ocorresse eu teria que levar o crânio do meu filho para ela fazer uma oração, e depois tinha que guardar em um baú. O feitiço só teria fim se eu colocasse o crânio novamente junto com o corpo. E contasse para alguém, mas até esse momento nunca havia feito isso, pois estava com meu coração cheio de ódio. 

O feitiço de fato deu certo. Em um acidente automobilístico morreram seu Horácio e os dois filhos mais velhos. Ficou apenas Felipe, que casou-se com Penélope e tiveram dois filhos, Pedro e Pâmela.

  — Quando Pedro, o seu avô, nasceu...”

Disse essas palavras olhando fixamente com aqueles dois olhos verdes para mim, e continuou sua história. 

“— Eu engravidei de Bernadete. O pai dela era um caminhoneiro, e já era casado. Já acostumada a tantos abandonos não me importei. 

Pedro tinha acabado de completar 14 anos quando o pai dele sofreu um aneurisma, vindo a falecer. Penélope resolveu então vender tudo e veio junto com os filhos residir em Boa Morada. Fiquei receosa, mas evitei qualquer contato. Até que Pedro conheceu Bernadete e os dois se apaixonaram. 

O motivo da proibição daquele namoro se dava pela maldição pois, se um descendente dele se juntasse com algum meu, sendo homem com certeza morreria. Proibi, mas sua avó acabou fugindo. 

Demorou pouco tempo e soube do nascimento da minha neta. Passaram-se apenas três anos e seu avô, Pedro, faleceu de ataque cardíaco. Ela ficou sozinha para sustentar sua mãe. Graças a Deus que sua mãe casou com um bom homem. Mas vocês não estão livres da maldição. Tenho três bisnetos, descendentes do velho Horácio. E agora meu Deus?”

A minha avó, diante de tudo aquilo, apenas chorava.  No que as lagrimas cederam um pouco pergunta:

— E agora mãe? O que será de meus netos?

Então foi que lembrei da narrativa da bisa e ressaltei.

— Temos como reverter essa maldição! A senhora inclusive já até começou. Contou para a gente esse segredo, agora só falta enterrar o crânio junto ao corpo.

E foi aí que saímos à noite à luz de lamparina no quintal, para tentar encontrar a cova do meu tio avô. Paramos no pé de roseira branca. Senti um calafrio. Minha bisa deu-me uma pá para que eu cavasse. Comecei a cavar, cavando sem parar. 

A cova estava com um clarão porque a lua estava cheia e muito brilhante. Parei um pouco a escavação porque me deparei com um metal; tirei da cova, e era um chocalho de ouro. Nessa hora engoli o choro, mas aquele chocalho mostrava que ali estava enterrado um inocente. 

Terminando de cavar, minha bisa beijou a caveira e chorou. Todos nós estávamos comovidos. Então ela olhou para mim e para minha avó e disse:

— Desculpem por tudo! Eu não queria que as coisas chegassem aonde chegou. Eu só queria ter criado meu filhinho, mesmo sem condições. Comendo só o feijão com farinha. Vivendo apertada. Mas o queria perto de mim. Pra mim ele não tinha pai, não queria saber do amaldiçoado dinheiro do pai dele. Mas devido a ganância mataram meu filho. Eu era muito nova, a única coisa que me passava na cabeça era me vingar. Perdão meu Deus. Pelo menos agora posso morrer em paz. Sabendo que consegui livrar meus descendentes dessa maldição.  

— Chegue aqui Filipe! Disse ela apertando bem minha mão. - Não conte essa história a ninguém, porque a ganância humana pode fazer retornar certas coisas. A vocês pertence uma herança muita grande. E você, minha filha, Fique em paz. Feliz com sua filha e meus bisnetos.

Ela a abraçou e nesse instante já era meia noite, e a bisa deu seu último suspiro na terra. Minha avó começou a chorar.

- Não vá embora mãe! Se eu soubesse que a senhora tinha sofrido tanto não a tinha abandonado.

Levamos o corpo dela para dentro de casa e esperamos o dia amanhecer para resolver a questão do enterro. Demoramos dois dias para organizar tudo. Minha avó apenas telefonou para minha mãe, dizendo que a bisa havia falecido e estava organizando o enterro.

Depois daquele momento fúnebre, fomos fechar a casa. Observamos que não havia mais animal. Parece que fugiram, e todas as suas plantas haviam murchado. Exceto o pé de roseira. Nos despedimos dali e minha avó contratou um caseiro para olhar a casa até quando conseguíssemos comprador para ela.

E conforme o prometido, não contei essa história a ninguém. E se você está sabendo é porque encontrou meu diário em alguma cova perdida.

Conto escrito por
Gracioneide

CAL - Comissão de Autores Literários
Agnes Izumi Nagashima
Francisco Caetano
Gisela Lopes Peçanha
Lígia Diniz Donega
Mercia Viana
Pedro Panhoca
Rossidê Rodrigues Machado

Produção
Bruno Olsen


Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.


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