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Antologia A Magia do Natal: 7x05

Conto de Mavetse Dionysopoulos
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Sinopse: O texto reconstitui o momento do nascimento de Jesus na São Paulo de 2024. Maria e Jesus estão em busca de um lugar para o nascimento de seu filho, o Salvador dos homens. Maria, uma moça de origem indígena  e José, um rapaz negro da periferia. O conto descreve os momentos em que eles finalmente encontram o local para Jesus nascer. 

7x05 - Onde não há Pecado nem Perdão
dMavetse Dionysopoulos

Os dias estavam quentes. Sampa ardia em brasa, por conta do sol. Pancadas de chuva após nuvens carregadas, amenizavam o calor; mas tornavam o dia, para alguns, mais cheios de dificuldades do que para outros. O casal passou o dia andando à procura de um abrigo, para que a mulher desse à luz. Seu nome, Maria.          

Ela tem uma pele morena, estatura mediana, sua barriga já está traçada com a linha que anuncia que o bebê irá chegar. Usa um vestido colorido solto de algodão cru, tecido no tear de seus ancestrais, embora seja um pouco pesado; por ser de linha fria, o tecido recai sobre seu corpo de mãe, de forma elegante e harmônica, trazendo frescor. Calça sandálias de couro feitas sob medida, para que seus delicados pés aguentem o calor do asfalto e possa ajudá-la a caminhar. Maria sabe que carrega em seu ventre o Salvador, a luz do mundo. Meses atrás, uma série de presságios e milagres anunciadores firmaram em seu ser, que a semente que trazia em seu ventre é o ungido, um bebê muito especial que trará ao mundo uma nova luz, a luz que pode ser acesa apenas pelo coração. Ante todos os sinais, o último veio na forma de um anjo a anunciar a sua condição de mãe do mundo; por isso mesmo, mãe dos pobres, mãe dos humildes, mãe daqueles que estão doentes, mãe dos que sofrem. 

O anunciador não apareceu com asas abertas e resplendentes, mas sim, na forma de um mendigo que lhe pediu comida, com suas vestes rotas e trazendo em seu semblante a luminosidade divina, o dom de Deus de estar entre seus filhos mais amados, gente humilde. Seus cabelos e barba prateados foram iluminados, para que trouxesse àquela que lhe dera o que comer e o que beber, que ela seria a mãe de Cristo. 

José, seu marido, recebera em sonho, a anunciação: com fé e resignação. Ele, este homem negro com cabelos encaracolados, espessos e volumosos, que ascendiam para o alto com toda a dignidade de seus ancestrais advindos da África, usava uma túnica crua; os pés fortes estão calçados com alpercatas feitas pelo próprio carpinteiro. Seu semblante sempre calmo e resignado, mas firme e concentrado, carrega belos traços, lábios grossos e bem feitos, nariz largo, sobrancelhas alongadas; sua testa recebe os primeiros firmes cachos que irão elevar-se ao alto como uma coroa; suas mãos são grandes e calejadas pelo trabalho de marcenaria, com uma delas, ele segura seu alforje. Leva suas ferramentas de carpinteiro, pousa a outra mão no ombro de sua esposa grávida, em um gesto de proteção e amor. O casal andou por vários dias, e as casas mais suntuosas e confortáveis, nunca foram abertas a eles. Aqueles que ali residiam não quiseram dar-lhes abrigo. Uns, por não acharem que fosse um casal confiável, os tinham como marginais; outros, pelo próprio egoísmo que traziam dentro de si, ao firmar sua posse e não querer partilhar, não querer dividir, não querer irmanar-se, entregues ao tabu do dinheiro. A cada porta fechada, as contrações de Maria aumentavam e ela lembrava da anunciação do anjo, do húmus brilhante e misterioso que ficou na cuia na qual ele comeu, que foi plantado no chão e de lá nasceu uma videira que cresceu e tornou-se esplendorosa e delicada. Mais um sinal que viria ao mundo: o Cristo. 

Continuaram a caminhar por uma Sampa quente, por vezes abafada e chuvosa. Quando caíam as tempestades de verão, um ou outro, com pena de casal, vendo-o abrigar-se debaixo de qualquer marquise, davam-lhe alguma esmola. Havia quem passasse olhando para o casal; ela, com seu vestido colorido, traços indígenas,  lindos cabelos negros que adornavam de mais beleza as suas vestes; ele, com sua cor de um ébano que reluzia ao sol. Alguns, olhando de longe, conseguiam enxergar naquele casal, dignidade, resignação, majestade. O bebê, confortavelmente na barriga de sua mãe, protegido pelo líquido quente que o fazia estar em berço materno, por ser o Cristo, o ungido, o Salvador… sabia que, em breve, viria uma pandemia, que muitos morreriam, muitos sofreriam. Ele, o sol invicto em todos os tempos, haveria de aplacar tanta dor.

 Após muito caminhar, o casal desceu dos pontos mais altos da cidade para os pontos mais baixos, enfrentou alguns perigos, entrou por vielas e ruas, bateu em algumas portas e, finalmente, chegou à uma humilde casinha, com um jardim na frente e plantas de proteção à entrada da porta. Dali, saiu uma senhora humilde e idosa que, vendo o casal sem ter onde pousar, deu-lhes guarida. A primeira coisa que fez a pobre senhora, depois de alojá-los em um cômodo no quintal de sua casa, foi: descalçou-lhes os pés, pegou uma bacia de água fresca e começou a lavá-los. Jesus, no ventre de sua mãe, sabia que um dia lavaria os pés de Maria Madalena, e seria julgado por isso. Maria, ao pousar as mãos em sua barriga, sentia os pensamentos do filho. Ao toque da senhora em seus pés, previu a frase de seu amado filho. “Aquele que for isento de pecado, que atire a primeira pedra”. 

Cristo estava por nascer. Já instalados em um cômodo nos fundos da casa da velha senhora, Maria começou a sentir com mais intensidade as dores do parto, e sua anfitriã cuidou para que ela desse à luz, de forma o mais confortável possível. Maria, então, segurou seu bebê nos braços para amamentá-lo, o aninhou com ternura e, inspirada por um anjo, começou a cantar aquela que seria a sua canção de ninar: “Alguém cantando longe daqui, alguém cantando é bom de se ouvir... Alguém cantando alguma canção. A voz de alguém nessa imensidão. A voz de alguém quando vem do coração, de quem mantém toda a pureza da natureza, onde não há pecado nem perdão”. 

Já era noite. Uma estrela despontou brilhante no céu, para anunciar que Jesus nasceu. Ante à toda dor que viria, Ele dormiu embalado na imensidão dos braços de sua mãe… onde não havia pecado nem perdão.

Conto escrito por
Mavetse Dionysopoulos

Tema de abertura
Jingle Bell Rock

Intérprete
Glee

CAL - Comissão de Autores Literários
Agnes Izumi Nagashima Gisela Lopes Peçanha Paulo Mendes Guerreiro Filho Pedro Panhoca Rossidê Rodrigues Machado Telma Marya

Produção
Bruno Olsen


Esta é uma obra de ficção virtual sem fins lucrativos. Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.


REALIZAÇÃO



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